Strucao Da Cidadania

A violência é um fenômeno de conceituação complexa, polissêmica e controversa, que gera muitas teorias parciais, isto porque ela é um evento pluricausal. 

Resumo

A violência é um fenômeno de conceituação complexa, polissêmica e controversa, que gera muitas teorias parciais, isto porque ela é um evento pluricausal. Acredita-se que a mulher, a partir do modelo familiar patriarcal, tende a adquirir uma posição de dependência que se repete ao longo das gerações e constitui uma das grandes contradições da sociedade: a desigualdade de gênero. Este trabalho teve por objetivo analisar as formas de enfrentamento todas as formas de violência contra a mulher como mecanismo para a construção da cidadania. O presente estudo é uma pesquisa essencialmente bibliográfica através do método hipotético dedutivo. Pode se observar    que a  desconstrução das redes que tecem a violência contra a mulher ainda levará muito tempo, porém, não seria utópico acreditar em seu término, na medida em que o que se construiu sócio-historicamente pode ter seu caminho refeito em outra perspectiva.  O combate ao fenômeno da violência contra mulher não é função exclusiva do Estado, e sim da sociedade que precisa se conscientizar sobre sua responsabilidade, no sentido de não ser conivente com este tipo de violência, pois, ao se omitir ela contribui para a perpetuação da impunidade. A violência contra a mulher tem raízes profundas que estão situadas ao longo da história, mas não são impossíveis de serem superadas.

Palavras-Chaves: Violência doméstica; mulher; gênero; legislação.

Abstract

Violence is a complex concept of phenomenon, polysemic and controversial that generates many partial theories, this because it is a multi-causal event. It is believed that the woman, from the patriarchal family model, tends to acquire a position of dependence that is repeated throughout the generations and is one of the great contradictions of society: gender inequality. This study aimed to examine ways of tackling all forms of violence against women as a mechanism for the construction of citizenship. This study is essentially a literature search through the hypothetical method dedutivo.Pode noted that the deconstruction of networks that weave violence against women still take long, however, would not be utopian to believe in its completion, in that what It was constructed historically-partner can have their way redone in another perspective. The fight against the phenomenon of violence against women is not exclusive function of the State, but the society needs to be aware of their responsibility, to not be complicit in this type of violence because, by omitting it contributes to the perpetuation of impunity. Violence against women has deep roots that are situated throughout history, but they are not impossible to overcome.

KeyWords: Domestic violence; woman; genre; legislation.

Resumen

La violencia es un concepto complejo del fenómeno, polisémico y polémica que genera muchas teorías parciales, esto porque es un evento multi-causal. Se cree que la mujer, desde el modelo de familia patriarcal, tiende a adquirir una posición de dependencia que se repite a lo largo de las generaciones y es una de las grandes contradicciones de la sociedad: la desigualdad de género. Este estudio tuvo como objetivo examinar formas de abordar todas las formas de violencia contra las mujeres como un mecanismo para la construcción de ciudadanía. Este estudio es esencialmente una búsqueda bibliográfica a través de la hipotética dedutivo. Pode método de señalar que la deconstrucción de las redes que tejen la violencia contra las mujeres todavía tienen mucho, sin embargo, no sería utópico creer en su terminación, en lo que fue construido históricamente pareja tiene su rehecho forma en otra perspectiva. La lucha contra el fenómeno de la violencia contra las mujeres no es función exclusiva del Estado, pero la sociedad tiene que ser consciente de su responsabilidad, a no ser cómplices de este tipo de violencia, ya que, al omitir que contribuye a la perpetuación de impunidad. La violencia contra las mujeres tiene raíces profundas que se sitúan a lo largo de la historia, pero no son imposibles de superar.

Palabras-clave: La violencia doméstica ; mujer ; género; la legislación .

Introdução

De acordo com Brasil (2006) o termo violência como “uso intencional de força física ou do poder real ou ameaça contra si próprio, contra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha possibilidade de resultar em uma lesão, morte, dano psicológico, deficiência ou privação de liberdade”. A violência é um fenômeno de conceituação complexa, polissêmica e controversa, que gera muitas teorias parciais, isto porque ela é um evento pluricausal que possui várias origens e expressões, assumindo designações diversas, conforme as percepções do imaginário coletivo e as sutis limitações entre ela e o que é socialmente aceito (Siqueira, 2016).

O mesmo autor ainda qualifica a violência como realidade sociocultural e não biológico-natural, diferenciando “impulso natural” de “gesto cultural”, porque enquanto a agressividade associa-se a necessidades de sobrevivência, a violência é fenômeno criado na vida em sociedade: ato de intenção socialmente construída. Em outras palavras, isso significa dizer que a violência não é gerada pelas diferenças biológicas que constituem os sexos feminino e masculino e sim pela cultura valorizadora do homem em detrimento da mulher, autenticando, por um lado, a dominação do masculino e por outro, a inferioridade do feminino.

Acredita-se que a mulher, a partir do modelo familiar patriarcal, tende a adquirir uma posição de dependência que se repete ao longo das gerações e constitui uma das grandes contradições da sociedade: a desigualdade de gênero. A relação de força e dominação vivida com o parceiro pode se manifestar de forma extrema através da violência. Desse modo, a violência baseada no gênero tem se constituído em um fenômeno social que exerce influência sobre o modo de viver, adoecer e morrer das mulheres. Assim, a violência doméstica se apresenta como uma possível consequência das relações hierárquicas e parte do pressuposto de superioridade do homem em relação à mulher (Silva, Lima & Mafra, 2015).

Waiselfisz (2015) em seu estudo sobre o mapa da violência homicídio de mulheres no Brasil é categórico ao afirma que a violência contra a mulher não é um fato novo. Novo, e muito recente, é a preocupação cada vez mais crescente com a superação dessa violência como condição necessária para a construção da identidade da mulher e da cidadania da mulher vítima de violência. E mais novo ainda é a judicialização do problema, entendendo a judicialização como a criminalização da violência contra as mulheres, não só pela letra das normas ou leis, e fundamentalmente, pela consolidação de estruturas específicas, mediante as quais o aparelho judiciário pode ser mobilizado para proteger as vítimas e/ou punir os agressores, que via de regra está no seio da própria família o agressor é sempre uma pessoa próxima a vítima fator que inibe essa mulher registrar o ocorrido e pedir ajuda, tal comportamento explica a subnotificação dos casos de agressão.

Segundo Silva, Lima e Mafra (2015) frequentemente a violência doméstica é evidenciada somente quando esta se manifesta de forma extrema, ou seja, quando ocorrem danos físicos consideráveis ou, mesmo, quando a vítima vai a óbito. No entanto, deve-se compreender a ligação existente entre a ocorrência da violência física e da violência psicológica, normalmente esta última precede à primeira. Logo, a elucidação das formas de violência que podem ser praticadas é de suma importância para possibilitar ao profissional a identificação de vítimas que sofrem ou podem vir a sofrê-las, auxiliando assim no processo de reconhecimento e desenvolvimento da própria autonomia muitas vezes desconhecida ou perdida nos relacionamentos hierarquizados.

A violência apresenta-se como uma forma de legitimação de poder do homem sobre a mulher, e, portanto denominada de violência de gênero. Nessa acepção, pode ser interpretada como educativa e punitiva, pois assume um caráter exemplar. Dessa forma, é fundamental compreendermos o conceito de gênero, como uma categoria teórica fundamentada em duas proposições. A primeira proposição é a de que o gênero seria um elemento das relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos, permeadas por quatro elementos distintos, mas relacionados entre si, que operam simultaneamente: os símbolos culturais, os conceitos normativos, as instituições sociais e políticas, e as organizações, bem como a formação da identidade subjetiva. Em segunda proposição, o gênero é uma forma primária de relação de poder, que designa à mulher o papel de sexo frágil, permitindo, assim, o controle sobre ela, ao impedir sua participação na vida política, social e econômica, de modo a consolidar o poder e naturalizar as posições masculinas e femininas como desiguais. Por conseguinte, gênero é um conceito-chave para analisar a relação de subordinação das mulheres e a mudança social e política. Corresponde a uma categoria histórica e, por essa razão, é passível de ser modificada (Siqueira, 2016).

Para Pasinato (2014) práticas e pensamentos sociais, em distintos espaços, ainda se mostram contrários à aceitação e efetivação de novas relações sociais entre homens e mulheres. Em pleno século XXI mulheres são assassinadas por serem mulheres e ainda são disseminados e legitimados argumentos para justificar violências e assassinatos, chegando- se ao extremo de culpabilização das mulheres pelas violências sofridas. A violência doméstica contra a mulher, também designada violência de gênero ou violência por parceiro íntimo, é um fenômeno complexo e de alta prevalência no Brasil. É reconhecido como um problema de saúde pública por afetar a integridade física e a saúde mental da mulher.

Nas últimas décadas, as transformações econômicas, políticas e sociais a produção de pesquisas a respeito do tema, a mobilização dos movimentos feministas e de mulheres, têm colocado a violência doméstica na cena pública no país, repercutindo na implantação de organismos de políticas para as mulheres, criação de legislação específica, a exemplo da Lei nº 11.340 – Lei Maria da Penha – e de serviços específicos para o atendimento às mulheres em situação de violência. Entretanto, a despeito das conquistas, muitos desafios persistem para a erradicação da violência (Carneiro & fraga, 2012).

Metódo

O presente estudo é uma pesquisa essencialmente bibliográfica através do método hipotético dedutivo, com delimitação temporal de 2006 a 2016, foram utilizados fundamentos teóricos de livros e artigos científicos publicados em meios eletrônicos como SCIELO, LILACS e BIREME, PUBMED. A pesquisa foi realizada entre os meses de fevereiro a abril de 2016. Tendo como referências apenas publicações em português. E as palavras chaves utilizadas formam os seguintes termos: violência contra a mulher, políticas sociais, feminismo e concepção de gênero. Os artigos foram organizados por expressões para posterior análise. Foi encontrado um total de 40 artigos a cerca do tema dos quais apenas 20 foram selecionados para a pesquisa por atenderem ao objetivo da pesquisa. Os critérios de inclusão para a seleção dos artigos foram baseados na temática da violência contra a mulher, o ano de publicação dos artigos, os trabalhos selecionados datam de no máximo 2006 até o corrente ano, e área de estudo, e como critério de exclusão artigos que abordassem a temática da violência contra idoso e/ou crianças e adolescentes.  O estudo do material bibliográfico foi realizado através da seguinte ordem hierárquica: leitura exploratória, leitura seletiva, síntese dos textos e interpretação.

Resultados e discussões

Segundo Peixoto e Heilborn (2016) desde a metade do século XIX até depois da Primeira Guerra Mundial, o panorama econômico e cultural do Brasil mudou profundamente. A industrialização e a urbanização alteraram a vida cotidiana, particularmente das mulheres, que passaram cada vez mais, ocupar o espaço das ruas, a trabalhar fora de casa, a estudar. Para compreender o quanto essa transformação econômica, mais a alfabetização das mulheres, o cinema, os meios de transporte, a substituição de bens produzidos em casa pelos oferecidos pelas casas comerciais, alterou inteiramente o ritmo de vida e os contatos que as mulheres e homens passaram a desfrutar. Essas mudanças trouxeram o contato com comportamentos e valores de outros países, os quais passaram a ser confrontados com os costumes patriarcais ainda vigentes.

 O mesmo autor ainda afirma que durante a década de 1970, os estudos sobre a mulher ganharam visibilidade e vincularam-se a movimentos sociais. O movimento feminista no Brasil iniciou-se nesse período como uma experiência histórica que enuncia genérica e abstratamente a emancipação feminina, e se desenvolve ao longo das décadas seguintes, dados pela referência a mulheres em contextos políticos, sociais, culturais e históricos específicos.

Nesse contexto, a categoria gênero, criada na segunda metade do século XX, surgiu com o propósito de evidenciar a opressão feminina e o caráter de construção histórica e social da desigualdade entre homens e mulheres, contrapondo-se ao determinismo biológico como explicação para as relações que são estabelecidas entre os sexos, o uso do gênero coloca em ênfase sobre todo o sistema de relações que pode incluir o sexo, mas que não é diretamente determinado pelo sexo, nem determina diretamente a sexualidade. (Socorro, 2015).

Para Oliveira (2014) a crítica feminista contesta o entendimento presente nas relações de sexo/gênero e a posição subordinada que as mulheres ocupam em uma dada sociedade, em um dado momento de sua história, assim como na produção do conhecimento. Trata-se de uma luta para transformar essas relações. Além disso, a crítica feminista também é resultado do processo de aproximação aos movimentos sociais.

Silva (2015) esclarece que o conceito de gênero agrega em uma única palavra um conjunto de fenômenos sociais, históricos, políticos, econômicos e psicológicos. Esse responde às características de pertencimento dos seres humanos a um ou outro sexo. Refere-se a relações culturais e de poder que, inicialmente, foram focadas entre homens e mulheres e que passaram a se estender a distintos grupos sociais:

Gênero foi a “categoria útil para análise histórica”, incorporada às discussões em torno desta temática, no que se refere à análise da diferença sexual e, mais tarde, estendida à diferença dentro da diferença. A partir daí, ficou insustentável e abstrato demais usar uma categoria essencialista como “mulher”. Qual “mulher”? Reconhecer que existem mulheres de cor, lésbicas, judias, pobres, mães e solteiras, colocava-nos a constante necessidade de situarmos a “mulher” no tempo e espaço, em determinada sociedade e cultura. Dessa forma, a superação do discurso patriarcal aprofundou-se no momento de irrupção da Crise dos Paradigmas e da emergência de um dos seus significativos empreendimentos intelectuais e culturais, os pós modernismos. Entendido como um movimento político e, ao mesmo tempo, epistemológico, imbuído da ânsia de fazer da visibilidade e da voz dos oprimidos um caminho para a construção de um conhecimento específico e de emergência de epistemologias, os pós-modernismos alimentaram, no seio dos Estudos de Gênero e dos feminismos, a possibilidade de se constituir uma Epistemologia Feminista (Silva, 2015).

O gênero é uma das referências recorrentes pelas quais o poder político foi concebido, legitimado e criticado. Ele se refere à oposição homem/mulher e fundamenta ao mesmo tempo o seu sentido. Dessa forma, a oposição binária e o processo social das relações de gênero tornam-se, ambos, partes do sentido do próprio poder, ou seja, as significações de gênero e poder constroem-se reciprocamente (Coelho, 2014).

Histórica e legalmente aos homens foi conferido o direito de controlar e exercer poder sobre as mulheres e as crianças. Encaradas como propriedade ou como fonte de trabalho e rendimento para a família, a lei via-as como categorias sociais dependentes, desprovidas de direitos. Esta herança cultural e legal, assente em séculos de dominação socioeconômica e ideológica, não só assegurou a prevalência do poder masculino no lar, como afetou dramaticamente a posição das mulheres e das crianças na sociedade, na lei e nas instituições.      As referências ao papel submisso das mulheres são de longa data e encontram-se, por exemplo, na literatura grega (“a mulher deve ser discreta, não deve discutir com o homem, nem falar primeiro”) e na própria lei romana que tolerava o homicídio conjugal no caso de elas serem adúlteras, alcoólicas ou na presença de outros comportamentos inapropriados (Gomes, 2012).

Silva, Pasoin e Vianna (2015) discorrem sobre o papel da mulher nesse contexto, as mulheres, submetidas a um sistema de socialização que as enfraquece e desqualifica, tendem a aprender atitudes de abnegação, resignação e silêncio. As relações entre os gêneros nos espaços público e privado são permeadas por assimetria de poder e elaboração social e cultural da identidade feminina, como mulher passiva e dependente que dá ao homem a condição de opressor e dominador. Quando a mulher vive em uma condição de subordinação ao homem, a violência é agravada, pois isso a coloca em situação de vulnerabilidade a atitudes masculinas excessivas, porque ela não é sujeito de sua própria vida. A idéia de que a mulher é submissa ao homem, expressa pelos profissionais deste estudo, contribui para a ocorrência da violência, o que é confirmado em outro estudo que diz que a desigualdade nas relações de gênero é considerada causa da violência contra mulher. (Silva, Pasoin & Vianna, 2015).

Dias (2010) em seu trabalho defende que a violência contra as mulheres é um aspecto comum no casamento, desde os tempos medievais. A doutrina de “cobertura” influenciou profundamente o seu estatuto, considerando as mulheres casadas como sendo legalmente inexistentes. De acordo com tal princípio, através do casamento, as mulheres perdiam a sua identidade legal individual, passando a constituir, juntamente com os maridos, uma entidade legal única, cujo representante era o homem. O referido princípio conduziu a inúmeras anomalias legais, fazendo com que os homens fossem responsáveis pelas condutas e os atos das mulheres e legitimando o direito deles as punirem e violentarem. As autoridades apenas advertiam os homens de que a disciplina por eles infligida ao gênero feminino devia ser moderada. A expressão coloquial “rule of thumb”, que teve origem em uma lei de 1768, afirmava que os “maridos tinham o direito de punir fisicamente as mulheres mal comportadas, desde que a vara não fosse mais grossa”.

Até ao final do século XIX não existiam leis em Inglaterra e nos Estados Unidos da América que proibissem os homens de maltratarem as mulheres, exceto no caso de haver danos graves ou homicídio. Tradicionalmente a lei também isenta os homens do crime de violação no contexto da conjugalidade. A noção de que o contrato de casamento legitima todo o tipo de atos sexuais, inclusive os que são violentos e fisicamente forçados, ainda continuam a estar presente no universo representacional e legal dos nossos dias. “Não só é verdade que ao casar o homem obtém uma espécie de imunidade à acusação de violação, como também parece ser verdade que as pessoas têm menos tendência para condenar os comportamentos sexualmente violentos se eles forem praticado contra a mulher com quem se está casado e não contra outra mulher. Para muitas mulheres o consentimento que é conferido aos homens para terem relações sexuais com elas no casamento só é revogado através do divórcio. Em suma, a percepção de que as mulheres têm um tratamento diferente perante a lei, não se sentindo por ela totalmente protegidas, continua a estar presente nos debates feministas e da jurisprudência dos nossos dias (Carneiro & Fraga, 2012).

      Para Hanada Oliveira e Scharaiber (2010) a conscientização da natureza histórica da desigualdade de gênero precisa ser repensada já que a desigualdade de gênero somada à ordem patriarcal vigente são alguns dos ingredientes que, unidos ao sentimento de culpa inculcado historicamente na psique das mulheres, contribuem para a perpetuação das relações desiguais de poder que acabam por acarretar em violência. Socorro (2015) descreve a violência como um fenômeno social e histórico de conceituação complexa, que envolve eventos de natureza diversa, relacionados às estruturas sociais, econômicas, políticas, culturais e comportamentais, que muitas vezes legitimam e fundamentam atos violentos contra as pessoas.

 Neste sentido, o termo gênero facilita a percepção das desigualdades sociais e econômicas existentes entre homens e mulheres, que se deve à discriminação histórica contra estas. A expressão violência de gênero deve ser entendida como uma relação de poder e dominação dos homens e de submissão das mulheres, que externa os papéis impostos historicamente a ambos. Violência contra a mulher é definida como aquela praticada contra a pessoa do sexo feminino, simplesmente pela condição de mulher, com a finalidade de intimidá-la para que o agressor exerça o papel de dominador e disciplinador.

Segundos dados de Brasil (2011) a violência contra as mulheres é diferente da violência interpessoal em geral. Os homens têm maior probabilidade de serem vítimas de pessoas estranhas ou pouco conhecidas, enquanto que as mulheres têm maior probabilidade de serem vítimas de membros de suas próprias famílias ou de seus parceiros íntimos. Na sua forma mais grave, a violência leva à morte da mulher. Sabe-se que de 40 a 70% dos homicídios femininos, no mundo, são cometidos por parceiros íntimos.

Em comparação, os percentuais de homens assassinados por suas parceiras são mínimos e, frequentemente, nestes casos, as mulheres estavam se defendendo ou revidando o abuso sofrido. A pobreza aumenta a probabilidade das mulheres serem vítimas de violência. Na violência doméstica contra a mulher, o abuso pelo parceiro íntimo é mais comumente parte de um padrão repetitivo, de controle e dominação, do que um ato único de agressão física.  A tendência atual dos pesquisadores é de considerar a interação de diferentes fatores pessoais, situacionais e socioculturais combinando-se para provocar o abuso.

Para o Ministério da Saúde e estudiosos que trabalham essa questão, a violência doméstica pode ser dividida em: violência física que ocorre quando alguém causa ou tenta causar dano, por meio de força física, ou através de algum tipo de arma ou instrumento que pode causar lesões internas: (hemorragias, fraturas), externas (cortes, hematomas, feridas). Violência sexual é toda violência sexual a ação na qual uma pessoa, em situação de poder, obriga outra à realização de práticas sexuais contra a vontade, por meio da força física, da influência psicológica (intimidação, aliciamento, sedução), ou do uso de armas ou drogas. Negligência é a omissão de responsabilidade, de um ou mais membros da família, em relação a outro, sobretudo, com aqueles que precisam de ajuda por questões de idade ou alguma condição específica, permanente ou temporária. Violência psicológica é toda ação ou omissão que causa ou visa causar dano à autoestima, à identidade ou ao desenvolvimento da pessoa. Inclui: ameaças, humilhações, chantagem, cobranças de comportamento, discriminação, exploração, crítica pelo desempenho sexual, provocando o isolamento de amigos e familiares, ou impedir que ela utilize o seu próprio dinheiro.

Dentre as modalidades de violência, é a mais difícil de ser identificada. Apesar de ser bastante frequente, ela pode levar a pessoa a se sentir desvalorizada, sofrer de ansiedade e adoecer com facilidade, situações que se estendem durante muito tempo e, se agravadas, podem levar a pessoa a provocar suicídio. É um problema de saúde pública e uma violação aos direitos humanos. Estima-se que o problema cause mais mortes de mulheres do que o câncer, a malária, os acidentes de trânsito e as guerras (Acosta et al, 2015).

No Brasil, o início da década de 80 foi marcado pela forte mobilização dos sujeitos do gênero feminino em torno da temática da violência contra a mulher. Sua articulação em movimentos próprios, somada a uma intensa busca por parcerias com o Estado, para a resolução desta problemática, resultou em uma série de conquistas ao longo dos anos. A mais recente é a aprovação da Lei nº 11.340/2006, que entrou em vigência no dia 22 de setembro de 2006, depois de ter sido amplamente discutida e reformulada por um Grupo de Trabalho Interministerial que analisou o anteprojeto enviado por um consórcio de ONGs (organização não governamental) — ADVOCACY, AGENDE, CEPIA, CFEMEA, CLADEM/IPÊ e THEMIS. A apreciação da proposição na Câmara Federal envolveu a sociedade civil ao longo de 2005, por meio de audiências públicas, em assembleias legislativas que ocorreram em vários estados brasileiros. Mas não foi somente a articulação a âmbito nacional que pressionou a aprovação do PCL 37/2006, que se transformou na Lei nº 11.340/2006, denominada Lei ‘Maria da Penha’(Carneiro & Fraga, 2012).

Ainda segundo o mesmo autor o não cumprimento dos compromissos firmados em Convenções Internacionais acarretou em denúncia ao Sistema Internacional, através da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), que após a avaliação do caso, publicou em 2001 o Relatório nº 54, que dentre outras constatações, recomendou que o país desse prosseguimento e intensificasse o processo de reforma legislativa que evite a tolerância estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica contra as mulheres no Brasil.

Dentro dessa conjuntura política a nova Lei nº 11.340/2006 veio como um passo em direção ao cumprimento das determinações da Convenção de Belém do Pará e da Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra as Mulheres (CEDAW), além de regulamentar a Constituição Federal. Essa Lei traz medidas protetivas à mulher vítima de violência doméstica e familiar (Oliveira, 2015).

Socorro (2015) destaque que, além disso, priorizando os crimes praticados contra mulher nos ambientes: doméstico, intrafamiliar e afetivo instituiu os Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, sendo que as varas criminais acumularão as competências cíveis — separação judicial e de corpos, por exemplo, e criminal – responsabilização do agressor, nos casos decorrentes de violência doméstica e familiar contra a mulher. Dentre as medidas protetivas elencadas na Lei ‘Maria da Penha’, algumas merecem destaque, diante de seus feitos intimidativos, bem como para a garantia da integridade física e moral da ofendida. Pode-se citar a obrigação de a autoridade policial garantir a proteção da mulher, encaminhá-la ao hospital, fornecer-lhe e aos dependentes o transporte que se fizer necessário, e acompanhar-lhe ao domicílio para a retirada dos pertences.

Além disto, a lei determina o encaminhamento de mulheres em situação de violência e seus dependentes a programas e serviços de proteção, garantindo-lhe os Direitos Humanos que se achavam positivados na Constituição Federal. À mulher vítima de violência doméstica e familiar também é garantida assistência jurídica gratuita, bem como o acompanhamento jurídico em todos os atos processuais. Avaliar quais serão os reais resultados destas ações neste presente momento é impossível, mas é inegável que a Lei apresenta uma estrutura para atender a complexidade do fenômeno da violência contra as mulheres ao prever um conjunto de políticas públicas, mecanismos de prevenção e punição, voltados para a garantia dos direitos humanos e da proteção da mulher vítima de agressão doméstica e familiar (Socorro, 2015).

Apesar das resistências de alguns juristas na aplicação dos dispositivos da Lei ‘Maria da Penha’, ela está ganhando seu espaço e apresenta-se como um importante instrumento, não só normativo, mas político-jurídico, admirável e de difícil contestação, na construção de uma sociedade justa e sem desigualdades pautadas sob as questões de gênero. O ideal neste caso seria trabalhar tanto com ações pontuais específicas, como com as políticas públicas transversais. Ao se adotar as políticas públicas transversais, objetivando a igualdade entre homens e mulheres, encontra-se um norte a trilhar na busca de um caminho que modifique o panorama da violência em geral e a de gênero em particular. A Secretaria da Mulher desempenha o papel de catalisadora neste processo articulando-se aos Conselhos ou Secretarias da Mulher em todos os Estados (Santiago & Coelho, 2010).

Para Silva (2015) o sistema jurídico-legal e judicial também é confrontado com inúmeros mitos acerca do papel e estatuto das mulheres nas nossas sociedades. Alguns desses mitos prendem-se com as seguintes crenças: o casamento é um compromisso para toda a vida; na família nuclear as mulheres devem desempenhar o papel expressivo e os homens o papel instrumental; em caso de divórcio elas beneficiam da pensão de alimentos assegurada pelos ex-maridos; as que são divorciadas com filhos correm um risco superior de exclusão social; por último, as mulheres inseridas no mercado de trabalho e com níveis de instrução similares auferem os mesmos rendimentos que os homens, entre outras pré-noções.

O Governo Federal Brasileiro lançou o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, em 2008, com o objetivo de propor o enfrentamento das diversas formas de violência contra mulheres de todas as idades, bem como ofertar atendimento específico e qualificado à sua saúde. Foram sugeridas medidas para disponibilizar atendimento integral às mulheres em situações de violência a partir da atenção básica, incluindo as unidades básicas de saúde e a estratégia saúde da família. Devido à complexidade do fenômeno, que resulta em diversas necessidades e demandas, tornasse imprescindível a atuação do setor de saúde no sentido de intervir na problemática (Vieira Marcoli & Correia, 2015).

Considerações finais

A violência contra a mulher é um fenômeno que sempre esteve presente na história da humanidade desde os primórdios da formação das sociedades. Na atualidade percebe-se manifestações no sentido de repressão, maior visibilidade e maiores discussões no âmbito nacional a cerca dessa problemática, em contraposição a um sistema deficiente e ineficaz de atendimentos especializados a estas mulheres vítimas de violência. A violência doméstica configura-se como um problema social, cultural, ético e extremamente complexo, e se torna pouco visível em virtude das subnotificações de casos ocorridos em detrimento do temor por parte das vítimas em denunciar o agressor.

A desconstrução das redes que tecem a violência contra a mulher ainda levará muito tempo, porém, não seria utópico acreditar em seu término, na medida em que o que se construiu sócio-historicamente pode ter seu caminho refeito em outra perspectiva. É necessário e urgente um ordenamento jurídico adequado e coerente com as expectativas e demandas sociais. Não basta que haja um ordenamento que tenha vigência jurídica, mas não tenha vigência social, isto é, que não seja aceito e aplicado pelos membros da sociedade.

O combate ao fenômeno da violência contra mulher não é função exclusiva do Estado, e sim da sociedade que precisa se conscientizar sobre sua responsabilidade, no sentido de não ser conivente com este tipo de violência, pois, ao se omitir ela contribui para a perpetuação da impunidade. É urgente a compreensão da sociedade de que os Direitos das Mulheres são Direitos Humanos, e que a modificação da cultura de subordinação calcada em questões de gênero requer uma ação conjugada, já que a violência contra a mulher desencadeia desequilíbrios nas ordens econômica, familiar e emocional.

A violência contra a mulher deve ser objeto de estudo de todas as áreas, O conceito de interdisciplinaridade é bastante difundido e os estudos de gênero, o seu debate deve unir as disciplinas a ponto de agregar valores e conhecimentos para o enfrentamento a esta problemática. É o tipo de violência que compromete a subjetividade feminina e sua cidadania. A atenção integral só é possível se houver acolhimento, uma escuta qualificada e um acompanhamento a essas mulheres bem como a seus agressores, objetivando diminuir as ocorrências e o impacto dessa violência na saúde e na vida da mulher. A violência contra a mulher tem raízes profundas que estão situadas ao longo da história, mas não são impossíveis de serem superadas.

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Waiselfisz, J. J.; (2015). Mapa da violência 2015 homicídio de mulheres no Brasil. 1ª Edição Brasília – DF.

 

Autoras

Tessya Hyanna Almeida Oliveirapossui formação em Psicologia (2015) pelas Faculdades Integradas de Patos. Atualmente concluinte da especialização em Gestão em Serviços Sociais e Políticas Públicas pelo Instituto Pró Saber (Feira de Santana – BA) e Saúde Mental pelas Faculdades Integradas de Patos. Desde Janeiro de 2016 é Psicóloga Clinica no Núcleo de Assistência Psicopedagógica e Psicológica (NAPP) das Faculdades Integradas Patos (FIP) e desde Fevereiro de 2016 é professora da Escola de Ciências da Saúde de Patos (ECISA). Possui experiência em Psicologia na área de ênfase em Psicologia Organizacional e do Trabalho, Clinica e Educacional.

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Jakeline Pereira de Lima – possui graduação em Fisioterapia pelas Faculdades Integradas de Patos (2012), atualmente é concluinte do curso de especialização em Higiene Ocupacional pelo Instituto Federal de educação ciências e tecnologia da Paraíba- FPB, é docente da Escola de Ciências da Saúde de Patos (ECISA). Possui experiência em Fisioterapia na área de neurologia e traumatologia e-ortopedia.

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Giglielli Modesto Rodrigues Santos – possui graduação em Fisioterapia pelas Faculdades Integradas de Patos (2012). Especialista em Fisioterapia Traumato-Ortopédica e desportiva pelas Faculdades Integradas de Patos. Atualmente é concluinte do curso de especialização em Higiene Ocupacional pelo Instituto Federal de educação ciências e tecnologia da Paraíba- IFPB. Mestranda em Sistemas Agroindustriais pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. Atua como docente das Faculdades Integradas de Patos. Possui experiência em Fisioterapia na área de Geriatria, Neurologia, Traumatologia e Ortopedia.

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