ATIVIDADES LÚDICAS E O MENOR TRABALHADOR
Robério Chaves Pinheiro
Sua educação, saúde e sua própria infância são colocados em segundo plano por representarem força produtora.
R E S U M O
Trata-se de um estudo que analisa as atividades lúdicas
praticadas por crianças, tendo como objeto de investigação a
rememoração sistemática da prática dos jogos infantis
presentes na tradição infantil, nos diferentes contextos sócio-culturais,
buscando identificar em que medida esses jogos são praticados
pela comunidade infantil trabalhadora, considerando o seu modo
particular de vida. Para a consecução de tais objetivos, são
utilizados depoimentos de adultos que relatam as suas experiências
enquanto especialistas de programas que atendem aos menores
trabalhadores. Da mesma maneira, crianças que trabalham
atreladas a programas oficiais de entidades filantrópicas e de
forma independente, narram as suas "aventuras" lúdicas
em casa, nas ruas, bairros, enfim, em lugares que tiveram a
liberdade de jogar das mais variadas formas possíveis. São
explorados, ainda, as diferentes maneiras de relacionamento com o
espaço da cidade, enquanto elemento de relações culturais,
formador/propiciador de uma rede de representações coletivas lúdicas,
abordando a problemática do menor trabalhador frente aos jogos
infantis. Essas narrativas, colhidas sob forma de entrevistas,
aqui especificadas como história oral temática, constituem a
metodologia de trabalho. Os resultados da pesquisa apontam para
novos caminhos e alternativas de programas de políticas públicas
a serem sugeridas para a implementação de ações nas áreas de
lazer na cidade.
1- UM ESTUDO ATRAVÉS DE RELATOS ORAIS
Discutir as Atividades Lúdicas e o Menor Trabalhador na cidade
de Jequié-BA/Brasil, é buscar na sua essência um reviver dos
aspectos de uma cultura em torno do trabalho, prazer e da diversão.
Suas práticas refletem a capacidade criativa de processos
vividos, partindo de diferentes manifestações de experiências
e reações de grupos diversos frente à vida cotidiana imposta
por um mundo moderno e contemporâneo.
Nas condições oferecidas pela "Cidade Sol" – Jequié-BA/Brasil,
que se apresenta com suas características urbanas tanto quanto
limitadas para que possa oferecer às suas crianças, momentos lúdicos
fundamentais nos seus momentos de vidas, verificamos uma questão
referente às crianças das classes populares que são pobres,
exploradas e dasassistidas que precisam de alguma forma estar
contribuindo através do seu trabalho para que o sustento da sua
família não falte. Diria ser a participação do menor para
aumentar o orçamento familiar na maioria dos casos.
Para a prática dessas atividades é explorado o espaço da
cidade, do bairro, da rua, da casa enquanto elemento de relações
culturais, formador/propiciador de uma rede de representações
coletivas lúdicas. É abordadas as diferentes maneiras de se
relacionar com o espaço, recortado e valorizado de diferentes
formas pelos atores sociais, na perspectiva dos jogos infantis.
Espaço de transformação das atividades socioculturais
entendemos que se trata de um aspecto importante para a formação
da identidade dos grupos sociais, por ser espaço de
pertencimento e de referência, simultaneamente.
Com a utilização da história oral temática enquanto
metodologia de trabalho que foi empregado buscou uma abordagem
essencialmente qualitativa da realidade construída e
interpretada, relacionada com os significados que as pessoas
atribuem aos processos sociais por elas vivenciados. Na pesquisa
de campo, a comunidade de destino foi investigada através dos
depoimentos a partir de roteiros empregados, com a utilização
de uma amostragem não probabilística, intencional, sendo
constituída de: 1o Grupo – Crianças que trabalham em programas
oficiais e extra-oficiais, nascidas na década de 80, que estejam
vivendo a sua infância (década de 90), na cidade de Jequié-BA/Brasil;
2o Grupo – Adultos que atuam enquanto especialistas de órgãos públicos
e/ou privados em programas oficiais do "Menor Trabalhador",
na cidade de Jequié-BA/Brasil.
Na prática de jogos infantis por essas crianças, procuramos
verificar um momento lúdico de aplicação dessas atividades,
entendemos que nas cidades modernas, os dados populacionais, a
urbanização, os meios de comunicação de massa e as influências
sofridas pelas indústrias, podem contribuir para que as práticas
desses jogos venham a ser impedidos, esquecidos e/ou rejeitados,
acreditando que o trabalho venha a ser a prioridade das pessoas
nessas cidades, não importando a idade que se iniciam a busca
pelo sustento familiar.
São atividades caracterizadas pela espontaneidade e descontração
quando vividos, transmitidos de uma geração a outra de forma
oral, via de regra, fora de qualquer vínculo oficial, vindo da
rua, de um bairro, uma praça, um parque, sendo incorporados por
quem os pratica em momentos livres, com diversas variações nas
suas regras.
Todos esses jogos são representações simbólicas onde as
pessoas têm a necessidade de criarem o que acham ser prazeroso
para o seu modo de viver. São manifestações livres e espontâneas,
embasadas numa cultura/histórica de um povo ou uma comunidade,
que tradicionalmente expressam valores e normas de convívio,
sendo inegável sua importância como instrumentos bio-psicosociais.
O mundo da criança recheado de sonho, imaginação, ludicidade,
cultura e arte, necessitam de interações que possibilitem
apreensões de experiências tanto positivas como negativas. São
momentos que podem favorecer o desenvolvimento das fases de
maturação da criança, de acumular e produzir conhecimento.
A prática das atividades lúdicas tem como fontes primárias a ação,
a intenção, o prazer, a alegria e o convívio. Implica num
universo onde a criança é levada a participar, assimilar e
reformular conhecimentos ora desenvolvidos, proporcionando uma
construção da autonomia e da criatividade. Sua relativa propagação
possibilita uma manutenção da vida da população, onde através
de atividades construídas, percebe-se a concretização da formação
social do indivíduo. O prazer em brincar permite às crianças
participarem de um processo de interação onde a busca do real,
mesmo que às vezes de forma implícita, é tarefa imprescindível.
A afirmação da criação, da alegria e do prazer através de
vivências dessas atividades passa por essas situações criadas
nos tempos de hoje, diria, sendo tutelados pelas condições
oferecidas por um mundo mais moderno, dinâmico e cheio de
modernismos e modernidades. O brinquedo, a brincadeira e os jogos
poderão significar enquanto agentes portadores de uma cultura
social se a comunidade que venha usufruir desses momentos tenham
oportunidades para a sua prática.
O problema do trabalho infantil é muitas vezes causado pelos
baixos salários que as famílias dispõem e o desemprego ameaçador
faz com que os menores saiam em busca do dinheiro para ajudarem
no sustento das famílias. Questionamos: a criança trabalhadora
brinca? Quando ela brinca?. É importante voltar a indagar sobre
a prática das atividades lúdicas para crianças que trabalham,
questionando se o seu tempo livre vem sendo tomado pelas obrigações
de uma determinada produção, impedindo assim, os seus momentos
de ludicidade. Da mesma forma, se esse momento de trabalho impede
a criança de estar em uma escola, entendendo que nesse ambiente
o jogo venha sendo usado como recurso pedagógico.
A realização das atividades lúdicas com a prática dos jogos
infantis, as arraias e pipas, gudes, peões, bolas, enfinques,
carrinhos de madeiras e latas, dentre outros, são usadas as
regras definidas pelo grupo, resgatando as relações sociais ou
interindividuais, com formas, conteúdos e significados,
aplicados enquanto práticas culturais e sociais. É destacado
por diversos autores que o ensino do jogo deve assegurar uma
aprendizagem que reconstitua a memória cultural, o lúdico e o
significado humano e social do jogo, garantindo à criança uma
prática contextualizada, com origem, fantasia, prazer, alegria,
sentido e significado para sua formação, enquanto reconstrutor
e produtor deste saber. Ao considerar o jogo como elemento de
cultura, HUIZINGA afirma, ainda, que o jogo tem, por natureza, um
ambiente instável. "A qualquer momento é possível à
"vida quotidiana" reafirmar seus direitos, seja devido
a um impacto exterior, que venha interromper o jogo, ou devido a
uma quebra das regras, ou então do interior, devido ao
afrouxamento do espírito do jogo, a uma desilusão, um
desencanto". Mostra o jogo enquanto expressão da cultura,
característico de toda a estrutura social. Sua tese principal é
fazer do jogo uma função geradora de cultura e desta para o
social.
A prática das atividades lúdicas tem como foco principal a
reelaboração sistemática dos jogos infantis presentes na tradição
do universo infantil, nos diferentes contextos socioculturais,
observando os espaços físicos disponíveis para a sua realização,
onde o enfoque central é dado para o conhecimento e a preservação
da nossa cultura e do nosso folclore, das práticas de lazer em
suas evidências, definições e desenvolvimento.
Nesta condição perguntamos:
E as crianças que trabalham?
As crianças que trabalham participam de atividades lúdicas?
Recorrendo ao que dispõe no Estatuto da Criança e do
Adolescente em seu artigo 6o verificamos que "é proibido
qualquer trabalho a menores de 14 anos de idade, salvo na condição
de aprendiz".
A Constituição Federal em seu artigo 70 – inciso 33 dispõe:
"Proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos
menores de 18 anos e de qualquer trabalho a menores de 14 anos,
salvo na condição de aprendiz".
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PNDA-IBGE) em
Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio, realizada em 1995,
revelou que 3,8 milhões de crianças, entre 5 e 14 anos de idade,
trabalham no País.
Identificamos aqui alguns pontos que possam servir para reflexão:
1 – Uma legalização do trabalho para as crianças sob um pano
de fundo chamado "aprendiz", através de dispositivos
constitucionais;
2 – Uma constatação de exploração do trabalho mostrando a mão
de obra da criança enquanto força produtora;
3 – Uma forma de permitir que as famílias pobres possam aumentar
seus rendimentos através do trabalho de suas crianças;
4 – Uma iniciativa que impede a participação das crianças em
atividades lúdicas.
SARTO enfoca que o problema do trabalho infantil é muitas vezes
causado pelos baixos salários que as famílias vem tendo e o
desemprego ameaçador faz com que os menores saiam em busca do
dinheiro para ajudarem no sustento das famílias. O autor
questiona: a criança trabalhadora brinca? Quando ela brinca?.
Diz que "considero importante que a criança tenha suas
obrigações familiares, religiosas, escolares e não passe o dia
todo brincando. Não concordo que a criança passe todo o dia
trabalhando e não tenha acesso à escola e as atividades lúdicas".
É importante voltar a indagar sobre a prática das atividades lúdicas
pelas crianças que trabalham, questionando se o seu tempo livre
vem sendo tomado pelas obrigações de uma determinada produção,
impedindo assim, os seus momentos de ludicidade. Da mesma forma,
se esse momento de trabalho impede a criança de estar em uma
escola, entendendo que nesse ambiente o jogo venha sendo usado
como recurso pedagógico.
Em contrapartida, o entrevistado afirma que as crianças que estão
trabalhando de forma independente "tem em alguns momentos,
fora as suas dificuldades, uma alegria maior em estarem na rua,
em brincarem bastante, em alguns momentos não terem certos
compromissos. Uma liberdade maior". Entende que essas crianças
estão em fase de formação, onde tem uma liberdade de forma
espontânea por prazer e ludicidade bem característico do
comportamento infantil, sendo mais oportunizadas para momentos de
vivências lúdicas. Diz, também, que essas crianças participam
de jogos de azar, a exemplo do dominó, cartas, pauzinho,
figurinha, etc…, apostando algum objeto que ela possua sem que
represente prejuízo financeiro.
Por acreditar que o trabalho vem ocupando o espaço dos jogos e
dos divertimentos, sentimos a necessidade de saber o que acontece
em termos de jogos, brincadeiras, ludicidade, lazer, com aqueles
que supomos não tem como viver isso. Importa aqui detectar essa
realidade, mostrando a necessidade de que haja na vida das
pessoas um tempo dedicada ao lazer como uma condição humana
premente.
As crianças que estão na porta de um supermercado ou na feira
livre, à procura de algum trabalho, tem um contato com o
crescente ciclo de violências. Nos grupos, as crianças menores
são espancadas pelas maiores quando entendem que de alguma forma
perderam a chance de ganharem o dinheiro. Por vezes, ao final do
dia, os menores são obrigados a dividir seus ganhos com os
maiores que pouco conseguiram naquela jornada de trabalho. Em
determinados intervalos, jogam apostando cartas, dominó,
figurinhas ou qualquer outro jogo que signifique o ganhar ou
perder dinheiro. Se não conseguem algum trabalho para aquele
momento, seja vigiar um carro estacionado ou carregar um pacote
de compras, mendigam algum trocado.
Considerados por alguns como uma "geração perdida", não
apenas na área educacional, sofrem a maior e mais humilhante
violência: a supressão da infância. Obrigados a um trabalho
forçado, passando o dia todo fora de casa e da escola, na
tentativa de ganharem o dinheiro para que possam comprar a comida
que na sua casa falta, essas crianças são impedidas de serem
crianças nas suas vidas. Identificamos que essas crianças têm
famílias, realizam tarefas e mendigam com um único intento:
ajudarem a sustentar suas famílias e/ou sustentarem a si próprios.
Essa supressão da infância com o intuito de poderem realizar
algum trabalho que possa render o alimento próprio ou da sua família,
origina-se na própria família, que obriga a criança a
trabalhar. Na rua esse menor entra em contato com o crescente
ciclo de violência, e muitas vezes torna-se a vítima da violência.
Convém aqui mostrar nossa preocupação com essas atividades
exercidas pelas crianças, no momento em que executam tarefas que
são seriamente consideradas por elas como "trabalho".
São grupos desprotegidos e imaturos, movidos por uma necessidade
exclusiva de sobrevivência que substituem a despreocupação e a
ludicidade normais da infância por momentos sem trégua em busca
de uma condição mínima de vida. Esquecem que são crianças e
perdem os momentos de sonhos, fantasias, bem como, as
oportunidades de poderem estudar.
As narrativas das crianças entrevistadas nos mostram se elas
jogam, brincam, se é que jogam e brincam. Essas atividades lúdicas
que as crianças possam estar participando seriam os jogos de
nosso estudo. Esses entrevistados esclarecem os motivos que o
levaram para participarem de um programa oficial intitulado
"Menor Trabalhador", sob a responsabilidade de uma
entidade filantrópica da cidade, bem como, os motivos que
impedem vivências lúdicas através de participações em
atividades de jogos infantis.
As crianças que estão na porta de um supermercado ou na feira
livre, à procura de algum trabalho, tem um contato com o
crescente ciclo de violências. Nos grupos, as crianças menores
são espancadas pelas maiores quando entendem que de alguma forma
perderam a chance de ganharem o dinheiro. Por vezes, ao final do
dia, os menores são obrigados a dividir seus ganhos com os
maiores que pouco conseguiram naquela jornada de trabalho. Em
determinados intervalos, jogam apostando cartas, dominó,
figurinhas ou qualquer outro jogo que signifique o ganhar ou
perder dinheiro. Se não conseguem algum trabalho para aquele
momento, seja vigiar um carro estacionado ou carregar um pacote
de compras, mendigam algum trocado.
É afirmado por uma criança que "a vizinha foi quem me
chamou para participar do programa. Eu não tinha idade
suficiente para participar. Daí, minha mãe disse: vamos lá ver
se arruma um trabalho para você". "… eu tinha 13
anos apenas". O motivo para ir participar do programa é
dito pelo entrevistado como uma forma de ajudar a família
comprando as coisas que ele precisasse. Concorda que a criança
deva trabalhar ao dizer que "desde quando ela estude eu acho
certo". A vizinha, a mãe e a criança encontram-se
irmanados pela procura de um trabalho, onde acreditam ser o
momento sublime e de glória para aquele que conseguir essa façanha.
Estar trabalhando pode significar uma melhor condição de vida
para a família necessitada.
Outro entrevistado diz que começou a participar do programa da
entidade por incentivo de um colega sendo autorizado por sua tia
para estar "cadastrado a espera de um emprego".
Perguntado se ele concorda que a criança trabalhe o entrevistado
diz que concorda desde quando "… ela estiver com uma idade
acima de 14 anos e não interferir nos estudos dela". Mais
uma vez é visto a participação da família induzindo a criança
para o trabalho. Sobre suas participações em atividades
esportivas e lúdicas vimos que as crianças tem tido poucas
oportunidades. Restringem-se as aulas de educação física do
colégio e as atividades promovidas pela entidade. Por poucas
vezes ela tem participado junto com seus amigos de jogos com
arraia, gudes, pega-pega e bandeirinha. Pratica futebol em uma
quadra poliesportiva de um colégio próximo a sua casa.
Acreditamos que o trabalho tem ocupado essas crianças onde os
seus tempos para brincarem ficam restritos.
Os entrevistados mostraram que ganham meio salário mínimo, não
tem carteira assinada, podendo estar fora das empresas que
trabalham quando completarem 17 anos (idade limite para
participarem do programa). De uma certa forma consideramos esses
entrevistados bem privilegiadas em relação àquelas crianças
que não estão atreladas a nenhum programa coordenado pelas
autoridades ou por grupos de especialistas. Embora aqui ache que
esse privilegio seja uma condenação a uma vida desumana.
As entrevistas realizadas com menores trabalhadores em condições
precárias, aquelas que de alguma forma procuram ganhar algum
dinheiro oferecendo seus serviços na porta de um supermercado ou
algum outro ponto da cidade, nos levar a constatar que:
1 – Trabalham como forma de contribuir com as despesas de sua
casa;
2 – A maioria não estudam, passam o dia todo trabalhando;
3 – Seu tempo é ocupado pelo trabalho;
4 – Tem poucas oportunidades para vivências de atividades lúdicas,
em particular para a prática dos jogos infantis.
5 – De uma forma geral tem a educação, saúde e a própria
sobrevivência comprometidas pelo trabalho forcado.
Quando vemos essa obrigação pelo trabalho que as crianças são
submetidas, principalmente, por incentivo dos pais e familiares,
acreditamos aí existir a luta pela sobrevivência nesse mundo tão
desigual e discriminador. Nas economias monetárias em geral e na
sociedade capitalista em particular, a intersecção do domínio
sobre o dinheiro, a luta pelo seu ganho para garantir o sustento
de cada pessoa forma um nexo substancial de poder social que não
podemos nos dar o luxo de ignorar.
A esse poder instalado vem a necessidade dupla dos seus
personagens: alguns que visam o lucro não importando quando,
como e de que forma possam adquirir. Tornam-se obcecados pelo
acumulo de riquezas que não vêem a mão de obra que produz a
matéria prima dos seus ganhos; outros, os quais são
representados pela maioria absoluta das populações, produzem as
riquezas trabalhando para que possam ter esse lucro como forma de
garantir as condições mínimas de vivência.
De uma forma geral, o ganho mínimo para uma condição desumana
de vida, impõem que todos de uma família estejam nas mesmas
condições de trabalho. O dinheiro passa a ser disputado pelos
que disputam o poder de acúmulo de riquezas com aqueles que tem
o alimento básico como objetivo de vida. As crianças aqui são
submetidas e exploradas em todos seus momentos: perde educação,
lazer, saúde, em busca de trabalho que aqui considero um momento
escravo.
Das entrevistas que realizamos, o que mostra um perfil da maioria
da comunidade infantil da cidade, percebemos que trabalham para
ajudar a sua família no sustento de sua casa. Bem fácil
constatar que nas portas de supermercados, nas feiras livres, nos
bares, restaurantes e locais onde haja grande fluxo de pessoas,
existem aglomerações de menores de todas as idades à procura
de alguma tarefa que possa lhes render algum dinheiro. Carregam
compras, tomam conta de carros estacionados, limpam vidros de
carros que param em semáforos, enfim, estão nas ruas à procura
de algum trabalho. Por diversas vezes encontramos crianças,
acompanhadas pela mãe, pai ou irmão mais velho, mendigando nas
portas das casas algum dinheiro ou um prato de comida. São
sempre expostas pelos adultos por serem dignos de pena e
merecerem a compaixão daqueles que na maioria das vezes não
negam seus pedidos.
Esses menores são explorados, principalmente, por sua própria
família. Seus horários para estarem nas ruas trabalhando ou
mendigando, variam conforme o local estabelecido para que possam
ganhar algum trocado ou alimento. Alem de terem que conseguir a
própria refeição que sacie a fome daquele dia, são obrigados
a voltar para casa com algum dinheiro ou comida. Deles dependem
as crianças menores, idosos e todos aqueles que não podem, por
algum motivo, estar nas ruas. Sua educação, saúde e sua própria
infância são colocados em segundo plano por representarem força
produtora.
E o nosso futuro? E os próximos dias dessas crianças?
Esse amanhã, enquanto um momento a ser descoberto pode tornar-se
uma provocação de vários caminhos e sentidos. A exploração,
a miséria, um mundo irracional, um futuro incerto paira nessas
vidas. Acreditamos que esse momento introduzido na vida atual
deva ser considerado toda uma realidade presente, respeitando a
realidade dos modos de vida e condições desses grupos,
oferecendo garantias de pelo menos uma sobrevivência digna.
2 – BIBLIOGRAFIA
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VOVELLE, Michel. Imagens e Imaginário na História. São Paulo:
Ática, 1997.
Publicado em 01/01/2000
Robério Chaves Pinheiro – Professor Assistente da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia/Brasil; Mestre em Memória Social e Documento (Convênio: UESB/UNIRIO)
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