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BRINQUEDOTECA…POR QUE?

Ernany Santos de Almeida

De origem européia, as brinquedotecas ou ludothèque (neologismo formado pela palavra latina “ludus” = brincar e a palavra “theke” de origem grega que significa depósito) surgiram na década de 60 do século XX, com o intuito de garantir a criança o direito de exercer essa atividade prioritária para o seu desenvolvimento, que é brincar. Em alguns países de língua inglesa, como Estados Unidos e Canadá é chamada de biblioteca de brinquedos (toy library).
No Brasil, as brinquedotecas surgiram na década de 1980 para denominar um tipo de ludoteca, caracterizada como “centro de lazer infantil” 1.
De acordo com as estudiosas no assunto, Cunha (1998) e Friedmann (1992), as duas palavras – ludoteca e brinquedoteca – possuem o mesmo significado e têm sido utilizadas nos países de língua portuguesa como sinônimos. No entanto, para outra pesquisadora, existe uma distinção entre os dois conceitos:
Ludoteca, […] diz respeito a uma instituição dedicada à preservação, ao cultivo e à proporcionalização do lúdico a pessoas de todas as idades, classes sociais, grupo étnico, etc […] Já a Brinquedoteca tem como cerne de sua proposta o brinquedo, o objeto e, poderia funcionar como um setor da Ludoteca (SILVA, 2000 p. l46-7).

De qualquer maneira, o movimento pelas Brinquedotecas no Brasil é relativamente recente, mas vem ganhando força gradativa, principalmente pela existência de vários estudos sobre o assunto e muitas experiências bem sucedidas, como é o caso do Laboratório de Brinquedos e Materiais Pedagógicos (Labrimp)2.
Fundado em 1988, pela faculdade de Educação da USP, o Labrimp tem como objetivo estimular a produção científica sobre a brincadeira e a Educação, além de formar educadores para estabelecer um vínculo entre teorias e práticas pedagógicas. Dispõe de brinquedotecas, acervo bibliográfico e um inventário de jogos e brincadeiras do Brasil e América Latina. Também oferece oficinas aos públicos infantil e adulto, conserva um museu de aproximadamente 500 mil brinquedos antigos e oferece serviços para garantir uma melhor compreensão do papel do brinquedo e da brincadeira na educação da criança.
Em São Paulo, outro órgão criado especialmente para estimular a ludicidade é a Associação Brasileira de Brinquedotecas (ABBRI)3 . Criada em 1985 pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), a ABBRI vem assessorando pessoas e instituições filiadas, informando-as dos avanços na área, auxiliando na criação e manutenção de brinquedotecas por todo o país, fomentando recursos para a realização de estudos, pesquisas e promovendo cursos, seminários e congressos para divulgar os trabalhos na área. Publica trimestralmente um periódico – o Jornal Brinquedista – que informa sobre os mais recentes estudos feitos nas universidades sobre o tema.
Dada essas informações que consideramos primordiais para contribuir com o movimento das Brinquedotecas, buscaremos agora, encontrar respostas para a seguinte questão: o que vem a ser uma Brinquedoteca e qual será sua importância na vida das crianças?
Ao se referir a Brinquedoteca, a autora Santos (2000, p. 58) nos diz que:
Falar sobre Brinquedoteca é […] falar sobre os mais diversos espaços que se destinam à ludicidade, ao prazer, às emoções, às vivências corporais, ao desenvolvimento da imaginação, da criatividade, da auto-estima, do autoconceito positivo, da resiliência, do desenvolvimento do pensamento, da ação, da sensibilidade, da construção do conhecimento e das habilidades.

A partir do conceito de Santos, definimos as Brinquedotecas como instituições recreativas, culturais e de utilidade pública que podem ser implantadas nas escolas, como proposta alternativa para completar ou, até mesmo, para neutralizar os efeitos da escolarização precoce. Caracteriza-se por ser um lugar que permite à criança obter material lúdico (jogos, brinquedos, livros…) mediante empréstimo, e também um local que pode lhe proporcionar todo tipo de atividade: artes plásticas, ciências, jogos, recreação, música e folclore, sempre sob a supervisão e orientação do ludoeducador 4 – também conhecido como ludotecário, brinquedista ou recreacionista.
Entendemos que estas instituições, uma vez implementadas, representam o reconhecimento e a valorização do brinquedo como fonte de desenvolvimento da personalidade e equilíbrio infantis; ajudam a cultivar o senso de responsabilidade, independência, auto-suficiência e valoração – fatores essenciais na vida em comunidade.
Segundo Cunha (1998, p. 412), o valor de uma Brinquedoteca está no fato de ser um espaço que “[…] desfralda a bandeira da luta pelo direito que toda a criança tem ao brinquedo e contribui fundamentalmente para a construção de um mundo melhor, baseado numa relação humana mais sensível e autêntica”.
Dessa forma, a extrema importância do jogo na vida da criança basta para justificar a criação e a funcionalidade de uma Brinquedoteca. No entanto, vale lembrar que para o seu bom funcionamento, tal instituição precisa estar sedimentada a partir de objetivos e funções bem definidas que ajudem a promover o desenvolvimento infantil. Para Cunha (1992, p.37-8), esses objetivos são, entre outros:
1. favorecer o brinquedo e criar oportunidades para que o maior número de crianças possa usufruí-lo;
2. resgatar a alegria de poder experimentar, descobrir e criar, tirada pela escola dia após dia;
3. assegurar a integração entre adultos, jovens, crianças e objetos em busca da comunicação, expressão, criatividade, conhecimento e prazer;
4. proporcionar aos pais e familiares mais um espaço para a discussão sobre desenvolvimento, aprendizagem e educação infantil.
Todas essas possibilidades que a Brinquedoteca pode fomentar é que nos leva a questionar cada vez mais a existência de espaços reservados a esse fim, onde seja possível a convivência com as outras crianças, de forma enriquecedora. O que se defende aqui é a necessidade de uma ação pedagógica voltada para a criação de espaços e cenários dentro da escola, que oportunizem a atividade criadora, a imaginação, a experiência ativa e prazerosa com objetos e pessoas, permitindo a aquisição/ressignificação de conhecimentos que se movimentem em direção ao saber.
Infelizmente, enquanto visualizamos uma nova concepção de educação, em que o lúdico se constitui no cerne da construção do conhecimento, o projeto da pré-escola ainda continua pautado no modelo tradicional, cujo principal objetivo é a instrução e o treino de habilidades e de conteúdos específicos de leitura, escrita e cálculo, onde as crianças ficam sentadas, apenas vendo e ouvindo, aprendendo só com os olhos e ouvidos. Ignora-se o resto do corpo, uma vez que se considera os aspectos afetivo e motor como processos estanques, sem nenhuma relação com o processo de aprendizagem.
Não queremos com isso dizer que a pré-escola deixa de utilizar a brincadeira como uma atividade pedagógica. No entanto, segundo pesquisas de Wajskop (1999), quando ela abre espaço para o exercício do lúdico, atribui a esta atividade uma função contraditória a de práxis social infantil: ou usa a brincadeira simplesmente como material didático com vistas à aquisição ou treino de habilidades que facilite o processo de alfabetização ou como uma atividade recreativa utilizada exclusivamente em momentos de lazer e de descanso.
No primeiro caso, evidenciam-se apenas os objetivos instrucionais, enquanto as maiores contribuições do brincar ficam esquecidas; no segundo caso, fragmentam-se as atividades, considerando a brincadeira como um momento de ociosidade e falta de ocupação em contraposição à seriedade dos exercícios e aprendizagens planejadas pelo professor.
Embora isso ocorra com muita freqüência, Wajskop (1999, p.25) acredita que a pré-escola organizada em torno da brincadeira infantil pode cumprir sua função pedagógica, ampliando o repertório vivencial e de conhecimentos da criança em direção à autonomia e à cooperação. Escreve ela: “A definição de brincadeira como atividade social específica e fundamental que garante a interação e a construção de conhecimentos da realidade pela criança é que nos permite estabelecer um vínculo com a função pedagógica da pré-escola”.
A brincadeira, ainda segundo esta autora, é entendida como um fato social, resultado de relações interindividuais, conseqüente de cultura, pressupondo uma aprendizagem social. Desta forma, “[…] a garantia de um espaço da brincadeira na pré-escola é a garantia de uma possibilidade de educação da criança em uma perspectiva criadora, voluntária e consciente” (WAJSKOP, 1999, p. 31).
Entendemos, contudo, que a garantia desse espaço só será consolidada quando houver uma tomada de consciência por parte dos educadores e principalmente dos pais, que ainda vêem com muito receio, às vezes com preconceito, a utilização de brinquedos e brincadeira dentro das escolas.
Dito isto, para que a idéia da Brinquedoteca faça parte do projeto pedagógico da Educação Infantil é necessário, portanto, deslocar seu eixo enquanto espaço da exploração livre, sem objetivos ou conseqüências relevantes, refletindo com os educadores e a sociedade em geral, o sentido do brincar-criar, da brincadeira como forma pela qual a criança aprende.
Por outro lado, é importante ressaltar que a Brinquedoteca, uma vez implementada não substitui a instituição da Educação Infantil, porém sua criação pressupõe a existência de uma proposta educacional que tenha como norte a ampliação das experiências e conhecimentos infantis, alimentando seu interesse pela transformação e pela dinâmica da vida social, por intermédio não apenas de situações de brincadeira, mas de cuidado e de aprendizagens orientadas.
Nesse sentido, para Cunha (1995, p.8) é preciso ter claro isto: “[…] a brinquedoteca não é apenas um lugar que tem muitos brinquedos, mas uma instituição baseada numa proposta educacional, um lugar onde todo o know-how é voltado para a criação de uma atmosfera muito especial, onde o mágico, o lúdico, a criatividade e o afeto têm prioridade”.
Finalmente, considerando o grau de importância das Brinquedotecas no desenvolvimento da criança, reafirmamos que tanto os pais, quanto os educadores devem compreender e incentivar a criação desses espaços, principalmente nas escolas, pois toda criança, independente de sua classe social, precisa ter um local onde possa se sentir livre para utilizar objetos de cores e formas variadas, arrumar e desarrumar ao seu modo. Não deve ser interrompida subitamente quando estiver brincando, porque este é o seu trabalho, a sua tarefa, a sua forma mais elevada de pesquisar, compreender o mundo e a aprender a viver nele.

1  A primeira Ludoteca criada no Brasil, em São Paulo, foi patenteada e outras instituições não podem fazer uso dessa designação. Já o termo Brinquedoteca foi patenteada pela ABB, que franqueia o nome a seus associados. Na presente obra foi adotado o nome “brinquedoteca”, pois acreditamos que esta denominação está mais relacionada à infância, alvo principal de nossa pesquisa.
2  Uma das responsáveis pela criação do Labrimp foi a Doutora em Educação Tizuko Morchida Kishimoto. Professora Titular e Pesquisadora da USP/SP é quem atualmente coordena o Laboratório, realizando estudos na área da ludicidade e o uso de jogos na Educação. Site:
www.labrimp.fe.usp.br.
3  A ABBri é uma associação filantrópica de caráter cultural e educacional. Está sediada em São Paulo e tem como presidente a Prof. Marylande Franco . Através da ABBri, o Brasil é um dos 46 países ligados a Internacional Toy Library Association – ITLA. Site:
www.brinquedotecas.com.br.
4 Essa profissão não é regulamentada no Brasil, mas é reconhecida e valorizada em países da Europa. Na Dinamarca onde a IPA foi fundada, a ludoeducação existe como qualificação da pedagogia.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CUNHA, Nylse H. Brinquedo, desafio e descoberta. Rio de Janeiro: FAE, 1988.
______. Brinquedoteca: definição, histórico no Brasil e no mundo. In: FRIEDMANN, Adriana. et al. O direito de brincar: a brinquedoteca. São Paulo: Scritta/abrinq. 1992.
______.  Brinquedoteca: um mergulho no brincar. São Paulo: Maltese, 1994.
______. Brinquedoteca: espaço criado para atender necessidades lúdicas e afetivas. Revista do Professor, Porto Alegre, n. 44, p. 7-8, out. / dez. 1995.
FRIEDMANN, Adriana. et al. O direito de brincar: a brinquedoteca. São Paulo: Scritta / abrinq, 1992.
______. Brincar: crescer e aprender. São Paulo: Moderna, 1996.
SILVA, Helen.  A ludoteca / brinquedoteca na visão de alguns dos seus integrantes. In: SANTOS, Santa Marli Pires dos. Brinquedoteca: a criança, o adulto e o lúdico. Petrópolis: Vozes, 2000.
WAJSKOP, Gisela. Brincar na pré – escola. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1999 (Coleção questões de nossa época, v. 48).

Publicado em 04/07/2010 13:58:00


Ernany Santos de Almeida – Pedagogo com pós-graduação em psicologia educacional com ênfase em
psicopedagogia preventiva.

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