Uncategorized

Artigo Entrid 1132

Para imprimir este artigo sem cortes clique no ícone da
impressora >>>

 

PATERNIDADE NÃO ASSUMIDA E SUAS NEFASTAS CHAGAS

Maria Alves de Toledo Bruns

A história da paternidade, ou seja, o processo pelo qual o homem foi considerado co-ator da reprodução humana, passa pelo interdito das relações consangüíneas, pelo tabu de incesto. Entrelaçada com a dinâmica das relações afetivo-sexuais entre homens e mulheres compõe, desse modo, a história da família no decorrer dos séculos. Todavia, assumir a paternidade não tem sido um comportamento comum a todos os homens. Para esses desertores da paternidade, ter ou não ter filhos foi e ainda é visto como decisão e responsabilidade da mulher. Por séculos, filhos de mães solteiras não tiveram a paternidade reconhecida. Esses filhos explicitavam as transgressões morais e sexuais da mulher. Filho de amores ilícitos tornava público o que era privado. Violar segredos de família tinha seu preço. Banidas pela família, restavam a essas mulheres-mães a vergonha, o desprezo, o sentimento de culpa. Desamparadas, recorriam a um convento, quando não a prostituição. Castigo merecido! Para aquela que foi incapaz de resistir à sedução e encantos do co-ator da consumação do ato gerador da vida. A roda dos enjeitados foi inventada não só, mas também, para acolher tais bebês.  E pasmem: a esse homem, co-ator da geração da vida, não cabia nenhuma punição! Pensar na criança para que? Não raro ele mesmo negava a co-autoria do ato sexual com o apoio dos familiares e amigos. Falando dessa forma dá impressão que esse jeito de ser homem não existe mais e que é coisa dos tempos de nossos bisavós. Mas não é; infelizmente, é um comportamento comum ainda nos dias atuais. Mais triste ainda é saber que mesmo com a comprovação do teste de paternidade esse apoio de familiares ocorre até hoje. Em especial se esse co-autor da concepção da vida for possuidor de bens materiais. Dividir riqueza! É um ato que só ocorre por intervenção judicial.
 Thurler(2004) aponta que uma de cada três crianças nascidas ao ano no Brasil não tem a  paternidade reconhecida.  A paternidade desertora é um problema nacional, pois envolve todos os setores da sociedade que vem há séculos “fechando os olhos” a essa postura masculina.
Nota-se! Jornais publicam: Bebê encontrado no lixão. Exclamamos: Que horror?! E, de fato, é um horror! Abominamos tal atitude. Bebês são para serem cuidados, aconchegados, amados pelos pais.  E indagamos perplexos: Como essa mãe pôde fazer isso? Ninguém pergunta: Cadê o pai dessa criança? Como esse pai, co-autor da criação da vida, pôde ser conivente com tal ação? Um ato realizado a dois não envolveria co-responsabilidades de conseqüências e riscos?
Humanizar essas indigestas ações é preciso… Soluções vêm lentamente ocorrendo. Intervenções judiciais, secretarias de educação e de saúde, entre outras medidas, estão empenhadas na desconstrução desse arquétipo cultural que constitui a deserção da paternidade. Acredito que a família e a escola possam acelerar este processo. Diálogos esclarecedores sobre sexualidade responsável e projetos de educação sexual nas escolas podem contribuir para a diluição dessas nefastas chagas que é a paternidade não assumida. Refletir sobre a dor vivida pela criança deserdada é um ato de compaixão.

Publicado em 30/04/2009 14:31:00


Maria Alves de Toledo Bruns – Doutora em Psicologia Educacional, Especialista em Sexualidade Humana, Psicanalista, Docente do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da FFCLRP-USP. Co-autora do livro “Adolescentes Profissionais do Sexo”, editora Átomo 2006 e líder do Grupo de Pesquisa Sexualidadevida/USP www.sexualidadevida.psc.br

Dê sua opinião:





Clique aqui:
Normas para
Publicação de Artigos