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DIFICULDADES EM APRENDIZAGEM MATEMÁTICA: UM PROBLEMA A SER RESOLVIDO

Déborah Cristina Málaga Barreto

Sumário: O baixo desempenho diante de situações enfrentadas diariamente, que envolvem o raciocínio lógico matemático não está vinculado exclusivamente a falta de escolarização. Através de avaliações que medem o desempenho acadêmico em diversos níveis, pode-se constatar que este problema encontra-se também em pessoas que encontram-se em fase de escolarização. Não é também um problema vivenciado por um estado brasileiro apenas, no entanto é importante que muitas reflexões aconteçam e atitudes sejam tomadas para reverter o quadro que se apresenta. O objetivo deste texto é contribuir para uma reflexão sobre esse assunto.

A preocupação com o baixo desempenho de alunos nas provas que medem o conhecimento matemático vem se acentuando nos últimos anos. As exigências de uma sociedade cada vez mais complexa e tecnicista fazem com que a matemática tenha um lugar de destaque nas ciências humanas e sociais e faz-se necessário compreendê-la para analisar, interpretar e usar dados e tecnologias que encontram-se presente no dia-a-dia.
O índice de desempenho acadêmico e emprego de informação adquiridas na escola,     em âmbito mundial, vêm sendo medidos pelo Exame Pisa. O PISA (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Alunos) é uma avaliação internacional aplicada a cada três anos pela OECD ( Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) a alunos de 15 anos de idade. “PISA é atualmente o programa internacional mais exaustivo e rigoroso para avaliar o rendimento acadêmico e para coletar informações acerca dos fatores estudantis, familiares e institucionais que podem ajudar a explicar as diferenças de rendimento.” (OECD, 2006, p.5)
Dessa avaliação participam 30 países que fazem parte da OECD e 27 países voluntários. A cada edição uma área é enfatizada, em 2000 a ênfase recaiu sobre a leitura, em 2003, matemática e em 2006, ciências. A escala de notas é padronizada para que os alunos obtenham média de 500 pontos
No Brasil, participaram da avaliação de 2006, alunos da 7ª, 8ª série do Ensino Fundamental ou alunos cursando o Ensino Médio de escolas públicas ou particulares, de 390 municípios. Apesar de o país ter um desempenho em matemática melhor em 2006, se comparado  com a última avaliação, na somatória geral teve como resultado uma média de 390 pontos, ou seja, ficou 110 pontos abaixo da média esperada. Conseguiu uma pontuação melhor que a obtida somente por dois países dos 57 participantes. Enfatizando: desempenho brasileiro foi melhor que apenas dois países participantes.
Com relação à Matemática, o PISA propõe uma avaliação que verifique capacidade de analisar, para raciocinar e comunicar de forma eficaz uma vez que, as pessoas planejam, resolvem e interpretam problemas matemáticos em uma série de situações que incluem conceitos matemáticos quantitativos, espaciais, de probabilidade ou de outro tipo. Na referida avaliação, o conceito de capacidade matemática utilizado é definido como:

capacidade do indivíduo para identificar e entender a função que desempenha a matemática no mundo, emitir julgamentos fundamentados, utilizar e relacionar-se com a matemática de forma que possa satisfazer as necessidades da vida dos indivíduos como cidadãos construtivos, comprometidos e reflexivos ( OECD, 2006,p. 314)

O relatório informa ainda (p. 315) que, o conhecimento e as habilidades matemáticas dos alunos foram avaliados segundo três dimensões: os conteúdos matemáticos aos quais se referem os distintos problemas e perguntas realizadas na avaliação; os processos que devem ativar para conectar os fenômenos observados com a matemática e resolver assim os problemas correspondentes; e, por último as situações e contextos que se usam como fonte de materiais de estímulo e nos quais se propõem os problemas [tradução nossa].
Bryant e Bryant (2008) elencam vinte e uma características exibidas por alunos que evidenciam dificuldades ou baixo rendimento em atividades relacionadas à matemática. As dificuldades com problemas escritos, os múltiplos passos para a resolução de uma situação problema, a linguagem matemática e a falha ao verificar se as respostas encontradas estão adequadas à situação proposta estão no topo do lista. Seguindo-se a essas encontramos outras tantas com as quais nos deparamos em diversas situações, tanto em sala de aula como em situações do dia-a-dia: necessidade de um tempo longo para realizar uma cálculo, contagem de quantidades tendo como apoio os dedos, falhas ou erros na resolução de operações simples, entre outras [tradução nossa].
Além de ser uma área que envolve e exige uma gama de habilidade, a matemática também envolve diversas peculiaridades. O alto nível de abstração e generalidade necessário é muito maior se comparado a outras disciplinas escolares que, embora se utilizem de conceitos abstratos, não fazem tanto uso do raciocínio de dedução. A linguagem formal utilizada é outra característica essencial da matemática, podendo ser utilizada de forma precisa e universal e, ao ser utilizada, permite abstrair o essencial do significado matemático conferindo-lhe um teor científico.
Dessa forma, encontramo-nos diante de um conhecimento muito abstrato, fortemente estruturado e hierarquizado, com alto poder de generalização, porque elimina qualquer tipo de significado referencial, e é, portanto, aplicável a uma grande variedade de situações e conteúdos. Em resumo, poderíamos dizer que o conhecimento matemático é caracterizado pelo seguinte:
A)É abstrato e geral. Tenta refletir o essencial das relações matemáticas, eliminando qualquer referência ao contexto ou a situações particulares.
B)É de natureza dedutiva, o que lhe confere, também uma estrutura fortemente hierarquizada.
C)Usa uma linguagem formal, muito diferente da linguagem informal, que se caracteriza por ser um sistema de sinais de autoconteúdo, cuja finalidade fundamental não é facilitar a comunicação, como no caso da linguagem comum, mas a inferência.
D)É rigoroso, preciso e não redundante.
E)Suprime intenções, emoções e afetos.
F)É teórico, impessoal e atemporal.(GREGORY E GÓMEZ-GRANELL,  2000,  p.291)

As habilidades matemáticas vão sendo construídas ao longo do desenvolvimento e iniciam-se bem cedo na vida das pessoas. Estudos científicos têm comprovado que crianças muito pequenas já desenvolvem habilidades matemáticas. “Nos humanos, a representação interna para quantidades numéricas se desenvolve no primeiro ano de vida, servindo de base, mais tarde, para a aquisição de habilidades para o aprendizado dos símbolos numéricos e a realização de cálculos”. (BASTOS, 2006; GREGORY E GÓMEZ-GRANELL, 2000) Durante todo período que antecede a escolarização a criança já faz uso de conhecimentos matemáticos em suas atividades diárias e brincadeiras.
Bastos (2006, p.203), explica as causas das dificuldades matemáticas segundo ordem neurológica ou não neurológica. Como causas não neurológicas o autor cita os fatores escolares, fatores sociais e a ansiedade diante  da matemática. As causas neurológicas são divididas em primária, na qual encontram-se a acalculia e discalculia do desenvolvimento. Na secundária encontram-se: deficiência mental, epilepsia, Síndrome de Turner, Fenilcetonúria tratada, portadores de síndrome do X frágil, síndrome fetal alcoólica, baixo peso, Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, dislexia, disfasia e outros.
Se não forem consideradas as síndromes, deficiência mental e demais causas secundárias e primárias acima citadas, responsáveis pelo insucesso escolar na matemática, a causa das dificuldades que as pessoas apresentam diante de situações envolvendo a matemática pode ser explicada pela falta de conhecimento que os professores têm a respeito do ensino e aprendizagem da matemática e a forma como esse processo vem acontecendo.
Portanto, determinar as causas da dificuldade apresentada torna-se de aspecto primordial pois , através da elaboração de um diagnóstico, para detectar  e realizar uma “radiografia” do problema, e até mesmo verificar se é uma dificuldade isolada. É importante ter claro se há uma falha no desempenho diante da atividade envolvendo números, cálculos e resoluções de problemas propostos pelo currículo escolar, ou se as habilidades exigidas diante dessas situações não estão presentes no aluno (REBOLLO E RODRIGUEZ, 2006)
Os professores que ensinam matemáticas deveriam aprofundar estudos sobre a aprendizagem dessa área visto que, neurologicamente, diversas áreas cerebrais necessitam ser ativadas durante a resolução de situações envolvendo a matemática: hemisfério direito, hemisfério dominante na linguagem, áreas de associação do hemisfério dominante, lóbulos frontais, parietais, ocipitais e temporal. Especificamente na aprendizagem matemática, Garcia (1998) aponta como aptidões relacionadas à aprendizagem matemática: organização viso-espacial, habilidades lingüísticas, leitura e compreensão de conceitos e procedimentos matemáticos, cálculos mentais rápidos, conceituação abstrata, habilidades de solução de problemas, execução oral e escrita; Funções motoras, uso das sensações táteis, habilidade de sequenciação; discriminação visual dos símbolos matemáticos escritos; Percepção auditiva, memória verbal a longo prazo; Memória de séries, realizações matemáticas básicas. Cada uma dessas habilidades requer uma área específica do cérebro para sua execução, mas é a integração das áreas que confere o sucesso ao desempenho em situações envolvendo atividades de raciocínio lógico-matemático.
Falar sobre pensamento matemático, raciocínio lógico ou desenvolvimento da aritmética, supõe mencionar os estudos piagetianos sobre este assunto. “Para Piaget, o conhecimento matemático se desenvolve como conseqüência da evolução das estruturas mais gerais de tal maneira que a construção do número é correlativa ao desenvolvimento do pensamento lógico”, segundo Orrantia (2006, p.158), o qual propõe uma análise das dificuldades de aprendizagem na matemática através da aritmética por ser a base sobre a qual se assentam os demais conteúdos, como também, por ser uma área na qual os alunos apresentam muitas dificuldades [tradução nossa].
Caldonazzo et al. (2006, p.117) afirmam que “a linguagem matemática não pode ser tomada como um amontoado de símbolos de uma linguagem formalizada”. Portanto, o fato de uma criança de 6 ou 7 anos recitar números ou séries numéricas não significa que ela consiga resolver situações envolvendo números e quantidades, significa, sim, um ato puramente verbal e sem significado, pois para compreender o número e trabalhar com questões aritméticas são necessários raciocínio e conceitos lógicos, não se pode esquecer que nesta faixa etária o pensamento é comandado por dados perceptuais. Assim, nesta fase, seria inútil o ensino de séries numéricas visto que a criança é incapaz de compreender o número e a aritmética.
Conteúdos envolvendo contagens, números e aritmética são aconselhados após a criança conseguir fazer conservação, fase em que a dependência de variáveis perceptivas não é requisitada e na qual ela está capacitada a pensar de forma reversível. Sem que a escola respeite estas características o ensino fica suscetível a não aprendizagem ou ao aparecimento das dificuldades de aprendizagem diante de conteúdos matemáticos que interferirão nas aprendizagens subseqüentes.
Apesar de parecer uma tarefa fácil, segundo a análise de uma pessoa adulta, a contagem envolve uma série de técnicas que vão se desenvolvendo com o tempo: nome dos números, contagem termo a termo, de ordem estável, valor cardinal, abstração e de irrelevância. A atividade de contagem a criança vai adquirindo a seqüência numérica convencional o que permitirá estabelecer elementos de um conjunto ou seja, a numeração. Além de exigir contato com a atividade, para realizar a atividade de contagem, com sucesso, é necessária uma maturidade adquirida por volta dos 7 ou 8 anos, afirma Orrantia (2006, p.167). A biologia proporciona os fundamentos para o número e o meio sócio-cultural proporciona as oportunidades e instrumentos para a aquisição dos conceitos numéricos.
Atividades onde há necessidade de fazer julgamentos entre maior e menor, mais e menos, pouco e muito, entre outras, às quais as crianças são expostas com freqüência, em diversas situações, favorecem a reflexão sobre conceitos que implicarão na construção do conceito de números são denominadas de esquemas protoquantitativos e fundamentarão a base de diversas aprendizagens na matemática.
Os conteúdos e oportunidades aos quais as crianças, com condições de aprender, são expostas antes de irem para a escola favorecem a aprendizagem mas não garantem que ela aconteça sem a ajuda do professor. Portanto, torna-se imprescindível que o ensino seja repensado para que ocorram mudanças na âmbito geral da educação e que se consiga uma construir a aprendizagem, ao longo da vida acadêmica, onde seja possível aplicar conhecimentos e resolver situações em que os alunos demonstrem que saibam formar conceitos, generalizar e utilizar informações baseadas em investigações e modelos de situações problemas complexos, relacionar diferentes fontes de informação e representação e traduzi-las de maneira flexível, podendo aplicar os conhecimentos.
Assim, concluímos que se foram entendidas e respeitadas as características próprias de cada faixa etária, as formas como as aprendizagens acontecem e o ensino adequado for utilizado, nossos alunos poderão ter um desempenho melhor não para subir numa posição em uma prova internacional como é o Exame PISA, mas para obter sucesso pessoal e profissional por possuírem um pensamento e raciocínio matemático avançado, por terem condições de aplicar seu entendimento e compreensão, assim como seu domínio das operações e relações matemáticas simbólicas e formais e desenvolver novos enfoques e estratégias para abordar situações novas , e também, poderão formular com exatidão suas ações e reflexões relativas a suas descobertas, argumento e suas adequações a situações originais.

Referências Bibliográficas:
BASTOS, J. A. Discalculia: transtorno específico da habilidade em matemática In: ROTTA, N. T., OHLWEILER, L. e RIESGO, R. S. Transtornos da Aprendizagem: Abordagem neurobiológica e multidisciplinar Porto Alegre: Artmed, 2006. p. 195-206.
BRYANT, B. R. and Bryant, D. P. Intruduction to special series: mathematcs and learning disabilities Learning Disabilities Quatelly  n.31 Winter 2008.
CALDONAZZO, A.; SALGADO, C. A.; CAPELLINI, S. A.;  CIASCA,S. M. Desempenho na resolução de problemas envolvendo o conceito aditivo em sujeitos com dislexia do desenvolvimento  Revista de Psicopedagogia; 23(71) 116-23, 2006.
GARCIA, J.N. Manual de Dificuldades de Aprendizagem: linguagem, leitura, escrita e matemática Porto Alegre: Artmed, 1998.
GREGORY, E. B. e GOMEZ-GRANELL, C. As estratégias de ensino e de avaliação em matemática In: MONEREO, C. e  SOLÉ, I. e col. O Assessoramento Psicopedagógico: uma perspectiva profissional e construtivista Porto Alegre: Artmed, 2000. p.289-304.
REBOLLO, M.; RODRÍGUEZ, A. L. Dificultades en el aprendizaje de las matemáticas Revista de Neurologia n.42 (Supl. 2) S 135-138.
ORGANIZACIÓN para la Cooperación y el Desenvolvimiento Econômico Programa para la Evaluación Internacional de Alumnos – Informe PISA 2006: Competências Científicas para el Mundo de Mañana. Disponível em:<
http://www.oecdbookshos.org/> Acesso em: 18 maio 2008.
ORRANTIA, J. Dificultades en el aprendizaje de las matemáticas: uma perspectiva evolutiva Revista de Psicopedagogia; 23(71) 158-80, 2006.

Publicado em 08/04/2009 16:06:00


Déborah Cristina Málaga Barreto – Professora na Secretaria Municipal de Educação de Londrina – PR; Especialista em Psicopedagogia; Mestranda: Universidade Estadual de Maringá (UEM)

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