Uncategorized

Artigo Entrid 1051

Para imprimir este artigo sem cortes clique no ícone da
impressora >>>

 

O CONSUMO CULTURAL DO NEO-FORRÓ: UM OLHAR PARA A DINÂMICA DA IDENTIDADE DE GÊNERO

Luciana F. de Oliveira Neiva

This article analyzes cultural representations of gender starting from the perspective of the Cultural Studies, which allows the understanding that the education happens in many places, that not only in the school, and still through a multiplicity of cultural products. For so much, it is made an analysis of the speech contained in the letters of three music of a band from Ceará The airplanes of the Forró, which interferes in the call neo-forró. The main argument is that the gender representations there revealed show the man’s macho position in relation to the woman, where the same is described as a sexual object, without own voice and always to the disposition of the masculine sexual desires. Those speeches produce gender identities at the same time in that you/they establish differences between men and women, perpetuating the place where both always occupied in our society typically macho.  
 
Word-key: cultural representations, identity, gender, Cultural Studies. 

Resumo
Este artigo analisa representações culturais de gênero a partir da perspectiva dos Estudos Culturais, o qual permite a compreensão de que a educação ocorre em muitos lugares, que não somente na escola, e ainda através de uma multiplicidade de produtos culturais. Para tanto, faz-se uma análise do discurso contido nas letras de três músicas de uma banda cearense Os aviões do Forró, a qual se insere no chamado neo-forró. O argumento principal é que as representações de gênero ali reveladas mostram a posição machista do homem em relação à mulher, onde a mesma é descrita como um objeto sexual, sem voz própria e sempre à disposição dos desejos sexuais masculinos. Esses discursos produzem identidades de gênero ao mesmo tempo em que estabelecem diferenças entre homens e mulheres, perpetuando o lugar em que ambos sempre ocuparam em nossa sociedade tipicamente machista. 

Palavras-chave: representações culturais, identidade, gênero, Estudos Culturais.

De Rapariga Eu Entendo
Aviões do Forró
De  rapariga  eu  entendo
Sou  viciado,  o  meu  consumo   é   mulher
Eu  fui criado  numa  mesa de baralho
Em  forró e vaquejada  e  bebendo
em  cabaré. (2x)

Papai   me disse:  meu  filho seja  homem
Não  vire  lobisomem
E  não discuta  com  mulher
Se for  preciso  tire a cobra  da  loca
Mas  nunca   mije de ‘coca’
Nem  deixe de beber   mé.

Mé , mé ,  mé, bote  mais  um  que eu  t ô tomando
Numa  lagoa  não  perco pra jacaré
Quando fico bravo  viro  um  sir i na  lata
Não  tenho  medo de  nada
E  o  que  me  mata  é  carinho  de  mulher

Mé,  mé,  mé, bote  mais um que  eu  t ô tomando
Numa  lagoa  não perco pra  jacaré
Quando fico bravo viro u m  siri na  lata
Não  tenho  medo de  nada
E o que  me mata  é  carinho de  mulher

De rapariga eu  entendo
Sou viciado,  o  meu consumo é  mulher
Eu fui  criado  numa  mesa de baralho
Em  forró  e  vaquejada  e bebendo
em  cabaré. (2x)

A letra acima é de uma música da banda cearense Aviões do Forró que anima inúmeras festas por todo nordeste brasileiro, bem como em outras regiões do país. Por ser uma das bandas mais requisitadas para shows e com grande audiência nas rádios locais, foi escolhida para ser objeto de análise deste estudo, abordando a relação entre o consumo cultural e a produção de identidades juvenis, mostrando como as questões de gênero são mostradas através das letras do chamado neo-forró.
A banda Aviões do Forró foi formada em agosto de 2002 em Fortaleza, Ceará, por três empresários do ramo musical, Ezequias Aristides, Antônio Paiva Duarte e Carlos Aristides. A escolha do nome se deu porque Aviões evocam, segundo seus idealizadores, um duplo sentido, que tanto pode ser algo grande, que voa alto, como mulher bonita, gostosa.
Os Aviões do Forró são conhecidos nacionalmente, fazendo muito sucesso por onde passa, principalmente, nos estados da Paraíba, Pernambuco, Ceará, São Paulo, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro, Piauí, Pará, Maranhão, Aracajú, Minas Gerais, Bahia, Manaus, Alagoas, Tocantins e Acre. Seus shows são muito apreciados pelo público forrozeiro, que gosta de curtir suas músicas que vão desde o estilo romântico até o estilo pé-de-serra.
A banda lançou de 2002 a 2006, quatro CD’s, sendo que o último, em apenas 2 meses, vendeu 700.000 cópias. Outro dado significativo de sua popularidade, é que ela possui 1000 fãs clubes espalhados por todo o Brasil. Segundo o site oficial dos Aviões do Forró, seus integrantes sentem-se muito felizes por conseguirem vencer o preconceito que havia contra o estilo musical adotado por eles, que é o vanerão, tipo de forró dançado no sul do país que se caracteriza por ser uma dança em que os pares giram pelo salão com imensa rapidez e mobilidade.
Falar de forró é falar de um ritmo alegre, contagiante e sensual, que costuma ser uma das músicas mais ouvidas no nordeste do Brasil. Para muitos, ele é visto como a manifestação genuína da cultura popular, enquanto outros afirmam que é mais um elemento da cultura brasileira modificado habilmente, a fim de virar moda e ser consumido como um bem cultural capaz de gerar grandes lucros para os investidores desse ramo. Para tanto, são criadas estratégias de veiculação desse produto que se dá, principalmente, através da mídia (rádio e televisão) e dos shows ao vivo, além de ser divulgado através de CD’s, DVD’s, MP3 player e outros.
Há uma enorme diferença de estilo entre o forró tradicional e o neo-forró. Sendo que o tradicional, também chamado de pé-de-serra, tipicamente paraibano, sempre esteve supostamente ligado às raízes nordestinas, ao seu povo e à sua terra; já no forró atual, houve uma banalização do ritmo com suas letras pobres, cheias de ambigüidade e apelo sexual, que exploram o imaginário masculino e, em muitas delas, desvalorizam a mulher.

A origem do forró sempre foi controversa. Sabe-se que surgiu no nordeste e foi amplamente difundido para o resto do país, através de Luís Gonzaga, em meados do século passado, seguido de outros grandes nomes como João do Vale, Jackson do Pandeiro e Sivuca.
Muitos acreditam que a palavra forró tenha sua origem no termo inglês for all (para todos), quando da chegada dos ingleses, no inicio do século XVIII, com a companhia ferroviária Great Western ao estado de Pernambuco para a construção de estradas de ferro na região. Diz-se que os mesmos promoviam festas, colocando à entrada placas onde estavam escritas as palavras “For All”, ou seja, todos eram convidados a participarem dos bailes, animados por ritmos próximos ao que hoje chamamos de forró, mas que na realidade era o baião, ritmo que se diferencia do forró por sua batida que é mais “quadrada”, ou seja, tem menos balanço.
 Outra versão, mais nacionalista e mais aceita entre os historiadores, para a origem da palavra é a do pesquisador Câmara Cascudo (1988), ao dizer que o termo forró surgiu da palavra africana forrobodó, que quer dizer bagunça, festa, mas que por ser mais difícil de pronunciar, acabou virando forró (lei do menor esforço). A primeira versão acabou sendo a mais aceita pelas pessoas por ter sido propagada pela mídia, o que nos confirma seu grande poder de persuasão.

O forró tradicional é constituído por vários tipos de músicas nordestinas como o xote, xaxado, coco, baião, rojão entre outras, animado pela sanfona de oito baixos (pé de bode), pelo triângulo, pandeiro, zabumba e agogô, acompanhado de dança e bebida. Muito tocado em festas juninas e em outras festividades, tem como principais temas a seca, o solo rachado, a fome, a miséria e o sofrimento do homem do nordeste.

Esse tipo de música nem sempre foi tão popular como é hoje e sua difusão se deu, principalmente, através do deslocamento de parte da população nordestina para os grandes centros da região sudeste no século passado.  A princípio, foram abertas casas de forró nas periferias, atendendo a um público restrito, que buscava diversão nas horas de folga do trabalho, assim como matar a saudade da terra natal. Posteriormente tornou-se modismo entre os jovens de classe média, tendo seu ritmo modificado pelas bandas modernas, passando a ser chamado de forró brega, forró universitário ou neo-forró.

Hoje existem inúmeras bandas de forró espalhadas em nossa região, a maioria advinda do Ceará, Pernambuco e Paraíba. Com seus mega-shows e ritmos diversificados, o forró moderno é composto de guitarrista, baixista, baterista e outros equipamentos eletrônicos, além de vários cantores. Há, ainda, muitos dançarinos que contagiam o público com coreografias e roupas sensuais, ou pela falta de roupa (como acontece com alguns grupos), sem falar nas próprias músicas com letras picantes que geralmente abordam temas que falam sobre sexo, sexualidade, triângulo amoroso, amores impossíveis, bebedeira, etc. Para alguns, o apelo sexual faz parte das raízes do forró e, ainda, dizem que não se importam com a letra, mas priorizam o ritmo e a coreografia.
Por ser uma música alegre, o forró é gostoso de dançar, e de preferência a dois, com muito requebrado, corpos coladinhos, coxas entrelaçadas, “fungado”   no pescoço, o que o torna um ritmo sensual, capaz de criar um clima de “azaração” durante os bailes, despertando o desejo sexual.
Jovens de todas as classes sociais freqüentam as festas de forró sem grandes pré-conceitos, possibilitando-lhes um sentimento de homogeneidade, de pertencimento, enquanto a festa durar. O modo de se trajar, geralmente um jeans, camiseta e tênis para os homens e saia e mini-blusa para as mulheres, acaba se tornando uma espécie de uniforme que iguala a todos. Canclini (2006) diz que apesar de vivermos um tempo de fragmentação, de heterogeneidade dentro de cada nação e de comunicações fluidas, em meio a essa heterogeneidade, encontramos códigos que nos unificam, permitindo que nos entendamos. As festas de forró e seu consumo funcionam como um desses códigos que servem para unificar a juventude em torno de uma linguagem, de uma moda e de um ritmo que envolve a todos.
Mas se a diferença de classe social é algo imperceptível durante os bailes, um olhar mais atento para as letras das músicas vai encontrar as diferenças de gênero contidas nas mesmas, onde o homem, como mostra a música que iniciou este estudo, deve honrar sua virilidade, jogando baralho, entendendo de rapariga, mijando de pé, bebendo muito e não tendo medo de nada. Já a mulher ocupa o lugar que sempre lhe foi destinado pela sociedade tipicamente machista e patriarcal, como um ser submisso, sem vontades ou desejos próprios, frágil e sempre à disposição do homem. É o que podemos observar na música abaixo:

Quem  É o Gostosão Daqui?
Aviões  do Forró
Vou te levar pra cama
Vou te deixar toda nua
Vou te morder
Vou te lamber safada!!
Você vai ficar tesuda
Vou te abraçar
Vou te beijar
Vou te deixar nas nuvens
É loucura de amor
Eu sou força total
No sexo sou campeão
Vamos fazer amor
Quem é o gostosão daqui?
Sou eu
Sou eu
Sou eu..!

Quem se pronuncia é um sujeito masculino que diz o que vai fazer com a mulher, chamada de “safada”. Ele tem a força total, é o máximo no sexo e se diz o gostosão do pedaço. E a mulher? O que ela faz? Quais são seus desejos? O que ela representa para o universo feminino? Apenas um ser sem voz, que não pode dizer o que quer e, quando há voz, ela é dada a partir de uma perspectiva masculina, que fala por ela ao compor letras, como na canção abaixo, em que a mulher gosta exatamente do que existe no imaginário masculino e em relação às fantasias sexuais dos homens. Uma mulher que gosta de levar tapas, de ser objeto sexual, escrava do prazer, que está na mão do homem “safadinho” para que ele faça o que quiser com ela:

Vai Safadinho
Aviões do Forró
Vai safadinho, vai vai safadinho
Vai
Vai
Vai

Adoro quando me pega de jeito
E tira logo a minha roupa
Fico louca cá
Me joga na cama
E me lambuza com o mel de sua boca
Eu fico louca cá

Eu me entrego pra você
Fazer o que quiser de mim
E viro escrava do prazer
Você me tem na sua mão
E faz de mim brinquedo
E me enlouquece de paixão
Me arrepia de tesão

Vai safadinho, vai vai safadinho
Vai, vai, vai, vai…
Bem gostosinho safadinho
Vai vai safadinho, vai, vai, vai, vai
Dá um carinho safadinho
Vai safadinho, vai, vai, vai, vai
Dá um tapinha safadinho
Vai safadinho, vai, vai, vai.

O nordestino é tipicamente machista e o forró legitima isso ao criar letras feitas por homens e endereçadas aos homens. O termo endereçamento provém dos estudos de cinema e diz respeito à relação entre o social e o individual. Ellsworth (2001) diz que se compreendermos qual a relação entre o texto de um filme e a experiência do espectador, por exemplo, poderemos mudar, influenciar e controlar a resposta do espectador, produzindo um filme de uma forma particular. Ou pode-se ensinar os espectadores a resistir ou subverter que um filme pensa que somos ou que um filme quer que sejamos. Assim, trazido para o discurso das letras do neo-forró, o modo de endereçamento perpetua o discurso e a diferença entre os gêneros, pois como diz Ellsworth (2001:47), o modo de endereçamento envolve história e público e expectativa e desejo.
Esse eu que se pronuncia nessas músicas se autodenomina “cabra macho”, “puteiro”, “beberrão”, “dono da mulher que deseja”, etc. A mulher, por sua vez, é mostrada, e se mostra, como submissa, objeto de consumo do homem que ama e disposta a qualquer coisa para tê-lo, até mesmo ser chamada de “safada”, “vagabunda”, “cachorrinha”, além de seus órgãos genitais receberem apelidos, os mais estranhos possíveis, como “bichinho”, “raxada” (com x mesmo!), etc. É o que se pode observar na letra da música abaixo que trabalha com a ambigüidade do termo bichinho:

Bichinho
Aviões do Forró

Vai, vai que tá gostoso
É, é bem gostosinho
Ela se deita e pede pra alisar seu bichinho. (2X)

Eu gosto de sair com a minha namorada
De preferência cedo e só voltar de madrugada
Mas quando chego em casa e vejo ela cansada
Deitada no sofá pra tirar uma cochilada

Enquanto ela descansa eu cuido do bichinho
Do jeito que ela pede, lhe fazendo carinho
Tou tão acostumado e não durmo sem ela
Deitada perto de mim
Pra mexer no bichinho dela.

Vai, vai que tá gostoso
É, é bem gostosinho
Ela se deita e pede pra alisar seu bichinho. ( 2X
)

As formas como homens/mulheres são apresentados nas músicas da maioria das letras do neo-forró revelam as posições ocupadas por ambos ao longo da história, onde o fator biológico sempre justificou essas diferenças e os papéis sociais que cada um deve ocupar na sociedade.

O lugar social das mulheres sempre foi determinado em oposição ao lugar social dos homens. Força, autoridade, virilidade, foram estabelecidas como símbolos culturais dominantes em oposição à fragilidade, à fraqueza, à sensibilidade, características consideradas femininas (SABAT, 1999: 246).

O forró é uma prática cultural, e como tal, é resultado de práticas sociais que instituem sentido à vida das pessoas, além de criarem e refletirem subjetividades, produzindo representações que atuam “… simbolicamente para classificar o mundo e nossas relações no seu interior” (Hall, 1997). Essas representações vão produzir nossas identidades, mas não de uma única vez, ou para sempre, pois “… o processo de representação, de produção de identidades, de constituição do sujeito não é realizado de uma vez por todas; pelo contrário, é necessário um processo de repetição contínua” (Sabat, 2002:98). Além disso, vale lembrar que a identidade se constitui a partir da diferença e que ambas são relações sociais, estando em estreita conexão com relações de poder, logo não são inocentes (Silva, 2000).
Ao afirmarem a identidade masculina, através de um discurso que os mostra fortes, viris, cabras-machos, “donos do pedaço e da mulher”, os homens estão dizendo que este universo masculino é a norma, portanto é superior ao universo feminino, que é tido como o “outro”, o diferente.
Assim, a identidade masculina se estabelece porque exclui a identidade feminina. Isso acontece porque tanto a identidade como a diferença só existem a partir da representação  e quem tem o poder de representar (o homem), tem o poder de definir e determinar a identidade. Mas, por outro lado, se a representação, por ser um sistema lingüístico e cultural, é uma forma de atribuir sentido, é também arbitrário e convencional, podendo ser questionado, criticado, subvertido. Só que essa subversão necessita de um sujeito crítico, capaz de enxergar essas diferenças e identidades formadas a partir das relações de poder. Aí entra a educação.
O consumo de músicas com conteúdos tão discriminatórios em relação à mulher nos leva a indagar o que nós, educadores, temos feito para despertar a criticidade de nossas(os) jovens em relação a essas práticas tão presentes nos artefatos culturais veiculados pela mídia, os quais produzem uma pedagogia que ensina as coisas do mundo, o modo de ser e agir, criando conceitos e pré-conceitos, valorizando determinados comportamentos em detrimento de outros, produzindo uma forma de regulação social ao reproduzir os padrões de vida que são os mais aceitos pela sociedade (Sabat, 1999). Ou como diz Giroux (2003:128):

O que está em questão para os pais, educadores e outras pessoas, é a maneira como a cultura, particularmente a cultura da mídia, tornou-se uma força educacional substancial, senão a principal, na regulação de significados, de valores e de gostos, que estabelecem as normas e as convenções que oferecem e legitimam determinadas posições de sujeito.

Então me questiono sobre quais identidades femininas e masculinas essas letras contribuem para formar ou perpetuar e como trabalhar a pedagogia da mídia, que por não fazer parte do currículo escolar, mas de um currículo cultural (vê, ouve e lê quem quer e o que quer), é mais atraente e sedutora, conquistando cada vez mais pessoas de todas as idades, classe social, sexo e níveis de ensino diferentes.
Sabemos que um dos motivos para que a mídia exerça tamanha influência sobre todas(os) é a grande quantidade de recursos tecnológicos que utiliza, além do apelo à emoção e à fantasia, mobilizando uma economia afetiva, eficaz e inconsciente. Ela possui um currículo, que sem ter o objetivo explícito de ensinar, ensina; transmite uma série de conhecimentos não reconhecidos como tais, mas que são vitais na constituição da identidade e da subjetividade (Silva, 1999).
E a escola? Que recursos disponibiliza para competir com a mídia? Como trabalha com as questões de gênero? Parece-me que as questões de gênero, entendidas como “… um conceito que se refere a masculinos e femininos, de forma diferente do que se compreendia como sexo” (Sabat, 1999:246), não são problematizadas na escola, nem em seus currículos, nem em seus livros didáticos, mas estão expostas nos mais diferentes produtos espalhados pela mídia, desde publicidade, filmes, desenhos, novelas, músicas e outros.
Silva (2000) argumenta a favor de uma estratégia pedagógica e curricular que trate a identidade e a diferença como questões políticas, dando conta de responder como elas são produzidas e quais os mecanismos e as instituições que estão ativamente envolvidos na criação da identidade e de sua fixação. Ele propõe um questionamento acerca da identidade e da diferença e que estimulemos nossas estudantes e nossos estudantes a perturbar, a transgredir e subverter as identidades. Isso implica dizer que não devemos nos fixar na diversidade, o que já ocorre no âmbito escolar e na sociedade como um todo, mas na multiplicidade de identidades, pois a primeira é estática, estéril e reforça o idêntico, enquanto a segunda é ativa, produtiva e estimula a diferença, não permitindo que ela se reduza à identidade, ou seja, o “outro” pode ser como eu não sou.
Particularmente, acredito que nós, mulheres,  se ainda somos descritas assim nos discursos enunciados pelos homens e não nos manifestamos contra tais representações, não é pelo fato de não enxergarmos que isto está aí presente em nosso meio e em quase todos os artefatos culturais, mas sim, porque esse comportamento passivo e de certa forma conivente faz parte daquilo que aprendemos como falso e verdadeiro, “relações essas que são construídas e que balizam o entendimento que cada um tem do mundo e de si mesmo” (Veiga-Neto, 2005:98).
Mudar discursos produzidos em artefatos amplamente consumidos por homens e mulheres, como é o caso do forró, parece uma possibilidade remota, já que é o sucesso, que essas músicas têm feito, que as faz produzir cada vez mais letras desse tipo. Mas pensar em incluir nas práticas pedagógicas um outro discurso que leve alunas e alunos a refletirem sobre o que estão consumindo, a questionarem quem e por que falam como falam sobre nós mulheres, talvez já seja um bom começo para uma eventual mudança em relação às questões de gênero.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AVIÕES DO FORRÓ. Biografia. Disponível em:
<http://
www.avioesdoforro.com.br> Acesso em: 28 de jan. 2007.
AVIÕES DO FORRÓ. Letras de músicas. Disponível em:
http://avioes-do-forro-musicas.letras.terra.com.br/ Acesso em: 28 de jan. 2007.
BASTOS, Marcos. Origem e evolução do forró. Disponível em:
<
http://www.xepero1.sites.uol.com.br. > Acesso em 28 de dez. De 2006.
CANCLINI, Nestor Garcia. Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da 2006.
CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 6ª ed. Belo Horizonte, Itatiaia – São Paulo. Editora da Universidade de São Paulo, 1988.
ELLSWORTH, Elizabeth. Modo de endereçamento: uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (org). Nunca fomos humanos – nos rastros do sujeito. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.
FORRÓ PÉ-DE-SERRA. Disponível em:
http://www.saladereboco.com.br/pe-de-serra.htm. Acesso em 28 de jan. 2007.
GIROUX, Henry A. Atos impuros: a prática política dos estudos culturais; tradução Ronaldo Cataldo Costa. – Porto Alegre: Artmed, 2003.
HALL, Stuart. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções de nosso tempo. Educação e Realidade. Porto Alegre: Faculdade de Educação da UFRGS. V.22, N.2, 1997.
SABAT, Ruth. Quando a publicidade ensina sobre gênero e sexualidade. In. SILVA, Luiz Heron da (org). Século XXI: Qual conhecimento? Qual currículo? Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.
SABAT, Ruth. Só as bem quietinhas vão casar. In: MEYER, Dagmar & SOARES, Rosângela (orgs). Corpo, Gênero e Sexualidade. Porto Alegre: Mediação, 2004.
SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de Identidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.
__________________. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (org). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
VEIGA-NETO, Alfredo. Foucault & Educação. 2 ed., 1 reimp.- Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

Publicado em 26/05/2008 16:32:00


Luciana F. de Oliveira Neiva – Mestranda em Educação, na área de concentração em Estudos Culturais pela
ULBRA-RGS, especialista em Docência, graduada em Letras Português e
Administração de Empresas pela UESPI. Professora efetiva de Língua Portuguesa do CEFET-PI / UNED-Floriano.

Dê sua opinião:





Clique aqui:
Normas para
Publicação de Artigos