Representações sociais sobre psicopedagogos/as escolares entre professores/as e coordenadores/as
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Um dos problemas educacionais mais graves é a não aprendizagem, que é tema de diversos estudos acadêmicos. A culpa em não aprender, de modo cediço, é atribuída pelas escolas ao/a próprio/a estudante.
Um dos problemas educacionais mais graves é a não aprendizagem, que é tema de diversos estudos acadêmicos. A culpa em não aprender, de modo cediço, é atribuída pelas escolas ao/a próprio/a estudante. Como solução é comum a realização de reunião entre família, professores/as e coordenação; ou encaminhamento para o/a psicólogo/a. Contudo, outro/a profissional indicado/a para atuar nesse caso é o/a psicopedagogo/a. Este artigo tem como objetivo identificar as representações de coordenadores/as e professores/as sobre o/a psicopedagogo/a escolar e suas funções. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, que utilizou como principal instrumento de coleta de informações o questionário. Participaram da pesquisa 10 professores/as e 5 coordenadores/as de escolas privadas e para análise dos dados adotamos a análise de conteúdo, na perspectiva de Bardin (1979). Os resultados analisados revelam que a maioria das representações do/a psicopedagogo/a não contemplam a amplitude de suas reais funções. Essas representações têm implicações para as práticas profissionais, como a contratação do/a psicopedagogo/a para o exercício de uma função que não é sua.
Introdução
Há cinco anos lecionando em turmas de 5º ano, na rede particular de ensino na cidade de Paulista-PE, e realizando pesquisas na rede municipal da referida cidade, solicitadas pelas disciplinas de Pesquisa e Prática I, II, III, IV e V da graduação em Pedagogia da UFPE; fomos percebendo o quão é frequente que os/as docentes da educação básica conversem entre si e com seus/as coordenadores/as acerca das dificuldades de aprendizagem dos/as estudantes e suas próprias dificuldades em ensinar e coordenar ações pedagógicas.
É cediço que casos de baixo rendimento escolar de estudantes extremamente violentos/as, com necessidades educacionais especiais e repetentes, por exemplo, sejam discutidos em reuniões de professores/as ou apenas comentados nos corredores escolares. É comum também observarmos e ouvirmos relatos de que as soluções encontradas por diretores/as e coordenadores/as são quase sempre as mesmas: chamar os/as responsáveis pelo/a estudante para uma conversa ou sugerir um tratamento psicológico. Destarte, a instituição escolar busca se isentar da “culpa” da não aprendizagem e/ou indisciplina do/a educando/a; transferindo-a para o/a próprio/a aluno/a, sua família e/ou o/a psicólogo/a. Rotula-se o/a discente de “problemático/a” e ele/a tem espoliado o seu direito a atendimento pedagógico adequado na escola. A falta de clareza sobre os papéis de cada profissional dentro da escola só agrava a situação. Para os/as coordenadores/as, que acumulam tantas funções (supervisionar, orientar, planejar, substituir profissionais que faltaram ao trabalho, organizar eventos pedagógicos etc.), é mais cômodo elidir mais uma responsabilidade: intervir nos problemas relativos aos processos de ensino e aprendizagem.Tal conjuntura revela ser premente a necessidade de atuação – dentro da escola – de um/a profissional cuja função precípua seja agir multireferencialmente, de modo corretivo e preventivo, no âmbito das dificuldades de aprendizagem: o/a psicopedagogo/a.
O presente trabalho reporta-se à análise dos fatores motivacionais da presença de psicopedagogos/as em escolas privadas, objetivando identificar as representações de educadores/as e coordenadores/as sobre esse/a profissional, mormente no que se refere às suas funções na escola. O estudo visa contribuir com as discussões acerca das necessidades de intervenções psicopedagógicas nas escolas e trazer à tona questões frequentemente relegadas no âmbito escolar por serem encaradas como extraescolares. Refletir de modo mais veemente sobre as representações sociais relacionadas aos/às psicopedagogos/as é algo vantajoso não só para estes/as profissionais, mas especialmente para educadores/as e coordenadores/as, que cotidianamente lidam com novas exigências educacionais e entreveem ser preciso estear suas ações idoneamente, plasmando-as com respaldo.
Representações sociais em educação
O conjunto de elementos, sujeitos e relações que compõem a escola sempre foi alvo de diversos estudos nos mais variados enfoques. A complexidade deste ambiente, seu cotidiano e os condicionantes de sua rotina requerem para sua análise a junção, nem sempre harmônica, de concepções relativas ao ato educativo formal. O processo laborioso de interpretação do contexto escolar exige diligência por parte daqueles/as que se dispõem a realizar pesquisas na área. Nesta perspectiva, para a realização de um estudo acerca das representações sociais que os/as educadores/as e coordenadores/as construíram – e constroem – sobre os/as psicopedagogos/as, é preciso uma reflexão analítica concernente ao cotidiano escolar levando em consideração temas como disciplina, avaliação, fracasso escolar e prática pedagógica; sempre levando em consideração que nada é trivial quando nos referimos à educação (BOGDAN & BIKLEN, 1994). Diante desse contexto, é oportuna uma breve explanação acerca do que postula a Teoria das Representações Sociais – TRS.
De acordo com Moscovici (2001, 2015), o fenômeno das representações sociais é um processo sociopsicológico que nos proporciona condições de compreender o “poder das ideias” por meio do acesso às motivações e formas de compartilhamento dos saberes que compõem a realidade. Essa ideia está pautada numa psicologia social que almeja entender de que formas o conhecimento é construído, desconstruído/reconstruído e integrado ao meio social. As representações sociais são uma forma de saber prático que atrela o sujeito ao objeto, permitindo que se adeque a seu meio; caracterizam-se pelo dinamismo, pois são construídas e adquiridas socialmente. O caráter estático, que lhe fora atribuído outrora, foi suplantado pela ideia de que são elaboradas durante processos de interações. Tem como eixo a ideia de que as diferentes formas de conhecer e de se comunicar são conduzidas por objetivos variados e passíveis de mudanças, estes estão atrelados a conceitos sobre pessoas, papéis e fenômenos do cotidiano (JODELET, 2001). À medida em que as representações vão sendo construídas pelos sujeitos em seus grupos sociais e vão sendo difundidas e aceitas, são naturalizadas passando a ser consideradas como verdadeiras, conquanto sejam só representações. Estas, “ajudam a decodificar a vida cotidiana” (ALEVATO, 1999: 91), explicitando o papel dos significados no processo de simbolização.
Neste estudo das representações sociais em educação, buscamos compreender não só o que os/as professores/as e coordenadores/as pensam sobre os/as psicopedagogos/as, mas também promover a reflexão sobre como e porque pensam de determinada forma. Essa busca visa possibilitar a discussão sobre as representações e, o desenvolvimento de uma consciência crítica, leva a ponderar que essas representações podem ser reconstruídas ou desconstruídas por meio do redirecionamento de práticas pedagógicas (SOUSA, 2002). Conhecer as representações sociais que docentes e coordenadores/as possuem implica em saber o que eles/as pensam sobre a necessidade do/a profissional de psicopedagogia no cotidiano escolar, entendendo que é neste mesmo cotidiano que “as representações nascem e para ali regressam” (PENIN, 1995: 27) é importante estar atento a ele bem como a sua manipulação. Quanto a esta, “partimos do pressuposto de que para apreendê-la é preciso examinar as representações dos sujeitos cotidianos” (PENIN, 1995: 20). São esses sujeitos, baseados na cotidianidade escolar que tomam decisões pautadas em suas representações.
Desenho metodológico
Para compreender as representações dos/as docentes e coordenadores/as sobre os/as psicopedagogos/as optamos pela abordagem qualitativa, por considerarmos ser a que melhor se adéqua ao trabalho em representações sociais, que visa captar o simbólico. Na pesquisa qualitativa o “significado” que as pessoas dão às coisas e à sua vida são focos de atenção especial pelo/a pesquisador/a. Nesses estudos há sempre uma tentativa de capturar a “perspectiva dos participantes”, isto é, a maneira como os informantes encaram as questões que estão sendo focalizadas. (LUDKE & ANDRÉ, 1986: 12) Além de aspectos de dimensão qualitativa utilizamos dados quantitativos ao longo do estudo, que foi norteado por uma revisão bibliográfica relacionada ao tema. Nosso campo empírico foi composto por escolas da rede privada de Paulista que têm ou já tiveram psicopedagogos. A escolha por esse tipo de instituição deve-se à nossa experiência como estudante na realização de pesquisas e como educadora em escolas privadas, e ainda pelo fato de que na rede municipal de Paulista não há a atuação de psicopedagogos.
O instrumento escolhido para coleta de informações foi um questionário com questões abertas, que nos permitiu uma maior aproximação com o que pensam os/as professores/as e coordenadores/as sobre os/as psicopedagogos/as, bem como de questões fechadas que visavam a caracterização o grupo. Para alcançar os objetivos da pesquisa, atendendo ao público que queríamos ouvir foram elaborados dois tipos de questionários. Destes, um foi destinado aos/às professores/as e o outro aos/às coordenadores/as. Com as perguntas dirigidas aos/às docentes procuramos depreender definições e funções do/a psicopedagogo/a na escola. O segundo questionário, destinado aos/às coordenadores/as que trabalham com psicopedagogos/as, continha quatro questões, que procuraram captar o(s) motivo(s) da contratação do/a psicopedagogo/a, identificar suas atribuições na escola, além de como foi, ou está sendo, sua passagem pela instituição.
Ao longo da pesquisa de campo tivemos o cuidado de que esses protocolos (questionários) fossem respondidos na nossa presença a fim de garantir a sua credibilidade. No momento da coleta de informações, a maioria dos/as participantes expôs oralmente e de maneira espontânea opiniões e experiências referentes ao trabalho dos/as psicopedagogos/as. As informações obtidas durante essas conversas informais constituíram uma riquíssima fonte dados, visto que através do diálogo as representações sociais emergem (MOSCOVICI, 2001). Os/as participantes da pesquisa foram em número de 15, sendo 10 professores/as e 5 coordenadores/as da rede privada de Paulista – PE. Com o intuito de preservar a identidade dos sujeitos pesquisados optamos por utilizar nomes fictícios para que pudéssemos nos referir a cada um dos participantes. Os/as professores/as estão na faixa etária entre 22 e 32 anos. Dentre os/as dez professores/as participantes, o único homem trabalha com turmas do 6º ao 9º ano regular e é formado em História. Três professoras trabalham com a Educação Infantil; seis lecionam em turmas do 1º ao 5º ano, destas educadoras, duas também ensinam em turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA), sendo que uma das docentes em questão trabalha concomitantemente com ensino superior. Dentre as educadoras, sete possuem graduação em Pedagogia, destas, cinco também cursaram o Magistério e duas são especialistas em Gestão Escolar. Das demais docentes, uma é licenciada em Letras e a outra em Matemática, ambas com especialização na área educacional. O tempo de atuação desses/as profissionais varia entre 3 e 12 anos.
Entre os/as coordenadores, quatro são mulheres e cursaram o Magistério e Pedagogia, uma possui especialização em Gestão e Coordenação Escolar. O único homem pesquisado é graduado em História. Os/as coordenadores/as possuem idade entre 26 e 43 anos. O tempo de atuação como coordenadores/as varia entre 6 meses e 11 anos.
Procedimento de análise
Para organização e análise das representações sociais dos/as professores e coordenadores/as sobre psicopedagogos/as adotamos a análise de conteúdo. Essa técnica tem por finalidade, a partir de um conjunto de procedimentos parciais e complementares, explicar e sistematizar o conteúdo da mensagem e o significado desse conteúdo, por meio de deduções lógicas e justificadas; tendo como referência sua origem (quem emitiu), o contexto da mensagem e/ou os efeitos dessa mensagem. Esse tipo de análise é pertinente por possibilitar a investigação de variáveis inferidas a partir dos indicadores explícitos e sua categorização. Essa análise foi realizada em três etapas: pré-análise; exploração do material e tratamento dos resultados (BARDIN, 1979).
Na pré-análise sistematizamos os dados obtidos durante as conversas informais com os/as docentes e coordenadores/as participantes e realizamos leituras flutuantes dos questionários respondidos por eles/as, isto é, uma leitura inicial de reconhecimento das ideias expostas. Essa etapa teve por objetivo identificar os temas que se repetiam com maior frequência a fim de categorizá-los para posterior interpretação. A exploração das informações consistiu na leitura detalhada do material e separação do mesmo em categorias seguindo o critério: apresentação de características comuns. Segundo Bardin (1979), a categorização é um modo de organização presente na maioria dos estudos qualitativos, visto que sintetiza uma forma de pensamento de determinado momento acerca de temas específicos. Após o estabelecimento das categorias passamos para o tratamento dos resultados, momento de inferências e interpretações referente às informações obtidas sobre o tema estudado.
Representações sociais dos/as professores/as
A partir da etapa de exploração do material foram definidas as seguintes categorias de análise para o grupo de professores/as pesquisados/as:
a) Psicopedagogo/a como junção da pedagogia com a psicologia
Os/as psicopedagogos/as são descritos/as por quatro professores/as como sendo profissionais que:
(…) misturam duas áreas: a pedagogia e a psicologia para auxiliar nos processos de ensinagem e aprendizagem. (Galena)
(…) juntam as teorias da pedagogia com a psicologia para agir de modo psicopedagógico. (Jade)
(…) fazem a junção de técnicas da psicologia e da pedagogia, aí formam a psicopedagogia. (Ametista)
(…) conseguem se basear na pedagogia e na psicologia para ajudar nas questões educacionais. (Júlio)
A partir desses relatos observamos que as representações sociais de psicopedagogos/as destes educadores esta atrelada à ideia de amálgama entre pedagogia e psicologia. Todavia, a pedagogia é a ciência que estuda a educação e muitas das descobertas da psicologia são usadas para determinar métodos de ensino. Já a psicopedagogia se fundamenta em várias das descobertas da psicologia e dos métodos da pedagogia, além de se basear em contribuições da psicanálise, linguística, fonoaudiologia e medicina, caracterizando-se desta forma como campo interdisciplinar. Cada uma dessas áreas do saber tem seu campo determinado, e o psicopedagogo surge num âmbito que não é especificamente nem pedagógico, nem psicológico. Nádia Bossa (2000) afirma que,
(…) não nos resta outra alternativa senão abandonarmos a ideia de tratar a psicopedagogia apenas como aplicação da psicologia à pedagogia, pois, ainda que se tratasse de recorrer apenas a estas duas disciplinas (o que não creio) na solução da problemática que lhe deu origem – os problemas de aprendizagem –, não seria como mera aplicação de uma à outra, mas sim como constituição de uma nova área que, recorrendo aos conhecimentos dessas duas, pensa o seu objeto de estudo a partir de um corpo teórico próprio, ou melhor, que busca se formar.
O posicionamento da autora revela o quão é cediça a representação sobre o/a psicopedagogo/a como mistura de duas áreas do saber. Na falta de um conceito adequado e respaldado sobre psicopedagogos/as, os/as professores/as inferiram, pela nomenclatura atribuída ao/à profissional, que se tratava de uma junção de áreas. Sobre isso Moscovici (1979) afirma que, atribuir uma característica, ou um rótulo, a algo que não conhecemos bem é uma necessidade, pois trata-se de uma maneira de “dar um lugar” a determinado objeto, dentro de um conjunto de conhecimentos já representados por determinado grupo. Quando atribuímos um valor a um objeto, ou a uma pessoa, de modo positivo ou negativo, nos baseamos nos juízos de valores já estabelecidos. Desta forma, a classificação consiste no enquadramento de uma imagem anteriormente pensada, de um objeto ou pessoa a um determinado grupo. Tal ação é chamada por Moscovici (1979) de ancoragem.
b) Psicopedagogo/a como profissional que vai além da pedagogia e da psicologia
Ao caracterizar o/a psicopedagogo/a alguns/as dos/as educadores/as pesquisados/as citaram o fato desse profissional “ir além” da pedagogia e da psicologia como elemento condicionante do diferencial do/a psicopedagogo/a. Desta maneira, percebemos uma comparação entre profissionais que atuam na área da educação, mas já não temos a ideia de junção de áreas. Sobre as funções do/a psicopedagogo/a algumas professoras afirmaram que:
O profissional de psicopedagogia tem como função analisar o comportamento do aluno em relação a sua aprendizagem. Ele deve tentar resolver os problemas de aprendizagens apresentados pelos educandos. Para isso tem que usar métodos, estratégias para uma aprendizagem significativa; mediar e/ou facilitar todo o processo de ensino-aprendizagem indo além da psicologia e da pedagogia. (Larimar)
O psicopedagogo ajuda os alunos, a coordenação, os professores e até o psicólogo. Tem um leque maior de atuação. (Rubi)
O psicopedagogo é mais que um pedagogo e um psicólogo, pois o olhar dele é diferente. (Turquesa)
Diante desses registros, é possível perceber que os protótipos guiam as classificações, que estão relacionadas às expectativas dos sujeitos. O ato de comparar e rotular revelam julgamentos que se tem sobre o objeto classificado, definindo, portanto, comportamentos em relação a ele (MOSCOVICI, 1979). Nesse caso, os/as docentes patentearam que “o/a psicopedagogo/a entra em cena quando o/a pedagogo/a e o/a psicólogo/a não são capazes de resolver o problema na escola” (Turquesa).
A difusão das representações sociais, de certo modo, condiciona o significado dado a determinado objeto. Para os/as professores/as participantes deste estudo, a percepção da realidade expressa na representação sobre psicopedagogos/as, serve de parâmetro para a relação delas com o objeto. Considerando-se que os conteúdos das representações sociais são integrantes de um repertório simbólico cujas fontes não podem ser desconsideradas nos momentos de análise dos discursos dos atores sociais em questão, é preciso compreender que cada pessoa forma sua própria opinião e compõem sua visão particular num processo individual (UMAÑA, 2002).
c) Psicopedagogo/a como profissional que trabalha com as dificuldades de aprendizagem
Menos da metade (30%) dos/as professores/as pesquisados/as possuem uma representação do/a psicopedagogo/a como sendo “o profissional que trabalha com as dificuldades de aprendizagem” (Pérola). Eles/as justificam essa ideia de diferentes formas:
Quando percebo que um aluno tem problemas em aprender, posso falar com a psicopedagoga. O trabalho dela é nos ajudar nisso. Se ela achar necessário pode encaminhar para um psicólogo, por exemplo. (Safira)
É o profissional especializado que trabalha principalmente abordando problemas de aprendizagem, de diferentes causas e problemáticas, geralmente este profissional trabalha com outros especialistas como pedagogo, psicólogos, pediatras, neuropsicólogos e neurologistas, cada um com suas particularidades, mas todos com o mesmo objetivo: melhorar as condições e qualidade da aprendizagem do aluno. (Ágata)
Os discursos dessas professoras revelam que há instituições onde o trabalho dos/as psicopedagogos/as é realizado de modo adequado, onde os/as educadores/as possuem representações coerentes com o papel desses/as profisionais. A harmônia entre o que pensam os/as docentes sobre o/a psicopedagogo/a e a realidade do trabalho desse/a profissional facilita a atuação de ambos/as, uma vez que as expectativas relativas à ação da psicopedagogia na escola não divergem com sua real função. Segundo Bossa (2000), na instituição escolar o/a psicopedagogo/a utiliza instrumental especializado, avaliações diagnósticas específicas e estratégias capazes de atender aos/às discentes em sua individualidade e promover avanços em suas produções escolares e extraescolares. Dessa forma, visa a ressignificação positiva da aprendizagem. Também é função do/a psicopedagogo/a assessorar a escola, dando ênfase para o papel que lhe cabe, seja reorganizando ações da própria instituição, seja encaminhando estudantes para outros profissionais.
Representações sociais entre coordenadores/as
As categorias emergentes dos registros dos/as coordenadores/as participantes foram:
a) O/a psicopedagogo/a como reforço escolar especializado
As representações dos/as coordenadores/as sobre o/a psicopedagogo/a são as referências que eles têm para guiarem seus comportamentos enquanto profissionais responsáveis, entre outras coisas, pela percepção da necessidade da presença de um/a psicopedagogo/a na escola e a seleção desses/as profissionais. Portanto, uma representação é uma preparação para ação (MOSCOVICI, 2001). Embora não determinem totalmente as decisões tomadas pelos sujeitos, as representações sociais limitam e orientam as possibilidades de escolha que são oportunizadas (CRAMER, BRITO & CAPELLE, 2001). Desta forma, as motivações e preferências resultam do contato que os indivíduos têm com produções culturais de determinados grupos. Destarte, a difusão das representações sociais, de certo modo, condiciona o significado dado a determinado objeto. No caso dos/as coordenadores /as participantes deste estudo, a percepção da realidade expressa na representação sobre o/a psicopedagogo/a, serve de parâmetro para a relação deles/as com o objeto.
Três dos/as coordenadores/as pesquisados/as citaram que na instituição escolar precisavam de um/a profissional que atendesse a um problema recorrente: a necessidade de um ensino de reforço especializado para estudantes com dificuldades em aprender. O trecho abaixo demonstra essa ideia:
O psicopedagogo, de início, foi contratado para dar assistência individual aqueles alunos com problemática, principalmente de aprendizagem… Seria um reforço escolar de um especialista. Infelizmente não conseguiu realizar ao menos um dos objetivos esperados e logo abandonou a função. (Bianca)
Tal pensamento demonstra que a escola detectou um problema na instituição e logo pensou na solução do reforço escolar com um /a especialista, todavia desconhecia o papel do/a psicopedagogo/a na escola. Este/a profissional poderia resolver o problema, visto que sua função é trabalhar com dificuldades em aprendizagem, mas não resolveria do modo como a escola esperava.
b) O/a psicopedagogo/a como parceria na prevenção e resolução de problemas de aprendizagem
Os depoimentos abaixo demonstram o conhecimento que duas das coordenadoras participantes da pesquisa têm acerca das reais funções do/a psicopedagogo/a na instituição escolar:
Ela tem que acompanhar o desempenho dos alunos, bem como dos professores; apoiar docentes, discentes e pais diante dos problemas de aprendizagem e dificuldades apresentados pelos alunos. E encaminhar para outros profissionais (psicólogos, neuropediatras etc.) quando necessário para diagnóstico mais preciso. (Alice)
Ela foi contratada por nós para ajudar a prevenir e solucionar os problemas na aprendizagem dentro da escola. (Clara)
As falas das coordenadoras revela que, antes da procura por um/a profissional de psicopedagogia, ambas tinham clareza e respaldo teórico sobre as funções do/a psicopedagogo/a escolar. Sabiam que ele/a atua nos processos educacionais com o intuito de dirimir a ocorrência dos problemas de aprendizagem (remediando-os e prevenindo-os) abordando aspectos didático-metodológicos, abarcando a formação e orientação dos/as docentes, além de realizar aconselhamento aos/às responsáveis pelos/as estudantes (BOSSA, 2000). Para isso, trabalha em parceria com outros/as profissionais como: neurologistas, psiquiatras, fonoaudiólogos/as, psicólogos/as, pedagogos/as e outros.
Considerações finais
O presente trabalho, tendo como objetivo identificar as representações dos/as professores/as e coordenadores/as sobre os/as psicopedagogos/as, possibilitou-nos constatar como tais representações sociais dos pesquisados parecem implicar nas suas ações na escola. Ao significarem o/a psicopedagogo/a como mais um/a profissional que atua nos processos de ensino e de aprendizagem, os/as professores/as e coordenadores/as justificam suas práticas pedagógicas caracterizadas por uma maior segurança na hora de intervir com educandos/as com transtornos/dificuldades de aprendizagem ou por uma delegação errônea de funções ao/a profissional em questão. Neste caso, professores/as e coordenadores/as acabam criando expectativas equivocadas concernentes aos resultados do trabalho do/a psicopedagogo/a escolar, uma vez que não conhecem bem a área de atuação desse/a profissional. O resultado disso são frustrações e descrédito. Assim, a representação social construída nas interações aparenta ter caráter natural e imutável nesse contexto onde não há esclarecimentos acerca das funções dos/as profissionais de psicopedagogia.
Através deste estudo foi possível constatar que a maioria das representações sobre o/a psicopedagogo/a não contemplam a amplitude de suas reais funções. Este é um aspecto que impede a realização de um trabalho profícuo e eficiente por parte desse/a profissional. Consideramos importante identificar e refletir as representações sociais dos/as professores/as por acreditar ser indispensável que as ações pedagógicas possam ter como parceria a psicopedagogia. Apreender o que professores/as e coordenadores/as pensam sobre o/a psicopedagogo/a e divulgar essas representações pode fazer com que haja uma conscientização por parte deles/as de que suas práticas pedagógicas têm como referência suas representações e que estas são construídas a partir de um conjunto de informações e crenças presentes no seu contexto sociocultural. Fica evidente a importância de investimento na formação docente, que precisa estar atualizada no que concerne às variadas possibilidades de intervenções que visam reverter casos de dificuldades na aprendizagem e potencializar a qualidade do ensino para evitar tal problema. O conhecimento relativo a atuação psicopedagógica precisa ser difundido de modo formal. As formações continuadas são oportunidades para essa divulgação. Sem esclarecimentos teóricos concernentes ao trabalho psicopedagógico corre-se o risco da reprodução de casos de insucesso nessa atuação, pois não haverá congruência entre os profissionais envolvidos no processo educativo.
Referências
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BOSSA, Nadia A. A psicopedagogia no Brasil: Contribuição a partir da prática. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.
CRAMER, Luciana; BRITO, Mozar José de e CAPPELLE, Mônica Carvalho Alves. As representações sociais das relações de gênero na educação superior: a inserção do feminino no universo masculino. In: XXV Encontro da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, 2001, Campinas, SP, Anais do ENANPAD, Setembro, 2001.
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Autora
Nathalie Sena da Silva
Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Pernambuco, especialização em Psicopedagogia Escolar e cursa o Mestrado Internacional em Ciências da Educação. Já atuou na orientação de projetos didáticos e formação de professores. Possui trabalhos publicados e premiados. Atualmente é professora na rede municipal de Igarassu e na rede municipal do Recife. Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.