3302 A Tomada De Decisao Para O Transplante Cardiaco

admin37109
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A tomada de decisão para o transplante cardíaco é um processo multidisciplinar difícil que, apesar de embasada por leis e regras claras e objetivas, transcorre também por aspectos subjetivos dos profissionais.

Resumo

A tomada de decisão para o transplante cardíaco é um processo multidisciplinar difícil que, apesar de embasada por leis e regras claras e objetivas, transcorre também por aspectos subjetivos dos profissionais. Diante do exposto, o presente trabalho tem como objetivo compreender os aspectos cognitivos e emocionais que permeiam o processo de tomada de decisão da equipe de saúde sobre a escolha do candidato do transplante de coração e as repercussões desse processo para os profissionais. Por meio de uma pesquisa descritiva e exploratória, de cunho qualitativo, contou-se com a participação de dois médicos e duas enfermeiras responsáveis pela tomada de decisão sobre a escolha do paciente a ser transplantado no principal hospital de referência em Fortaleza – Ceará. Estes responderam a um roteiro de entrevistas semiestruturado, avaliados por meio de análise de conteúdo de Bardin. Entre os resultados, observaram-se as percepções dos profissionais sobre os critérios de inclusão previstos por lei e as dificuldades emocionais enfrentadas por esses profissionais durante o processo de tomada de decisão, na notificação da notícia ao paciente e família e, posteriormente, no lidar com a reação dos familiares. Pode-se concluir, portanto, que o processo de tomada de decisão é baseado em leis, contudo, utiliza-se também da empatia entre profissional e paciente, e do investimento pessoal que esse paciente faz em seu tratamento. Observa-se também que tal ação influencia esses profissionais, de forma que, em alguns casos, se faz necessário um auxilio psicológico.

Palavras-chave: tomada de decisão; transplante; coração; expectativa

Introdução

    Um transplante (ou transplantação) é a transferência de células, tecidos ou órgãos vivos de uma pessoa (o dador) para outra (o receptor) ou de uma parte do corpo para outra (por exemplo, os enxertos de pele) com a finalidade de reestabelecer uma função perdida (BRASIL, 2013). Um procedimento complexo, porém antigo, com relatos de lendas sobre a ocorrência de transplante em seres humanos que datam de 300 a.C.. Um deles é o registro de que um médico chinês abriu o estômago de dois homens, explorou o coração e, após remover e trocar seus órgãos, administrou-lhes uma droga maravilhosa que os recuperou. Outra lenda é a dos médicos, Cosme e Damião, que amputaram a perna de um homem com problemas vasculares, enquanto este dormia em uma capela destinada a estes santos, sendo que a perna reimplantada havia sido retirada de um cadáver enterrado naquele dia e, que após o procedimento, o homem conseguiu deambular normalmente (BOLLINGER, 1991).

    O histórico mais antigo comprovado na história foi, entretanto, em 1967, quando Christian Barnard, desconhecido cirurgião de um hospital sul-africano da Universidade de Cape Town, tornou-se o precursor dos transplantes cardíacos bem-sucedidos de humano para humano. Ele realizou o primeiro transplante em um paciente de 54 anos portador de uma severa doença nas artérias coronárias e de múltiplos infartos do miocárdio, em que a doadora era uma mulher de 24 anos com morte cerebral. A cirurgia foi realizada usando a técnica previamente descrita por Lower e Shumway e o paciente sobreviveu 18 dias, tendo como causa mortis uma pneumonia (HARJULA et al, 1995; LAMB, 2000).

    Hoje, com o avanço da ciência, essas cirurgias são realizadas com maior constância, havendo inclusive filas de espera, que forçam a criação de regras de inclusão na lista de espera, e de prioridades. No senso comum, permanecem, todavia, dúvidas sobre o processo de transplante, como: Quem deve receber um órgão? Quem possui prioridade? Quanto tempo leva para receber este órgão? Como se dá a lista de espera? De acordo com o Programa Estadual de Transplantes (PET, 2010), podem receber o órgão pessoas com problemas graves de saúde, como insuficiência renal crônica, doença cardíaca, pulmonar ou cirrose hepática, por exemplo. Nestes casos, o médico faz uma indicação precisa de transplante de órgãos e/ou tecidos. Segundo o Sistema Nacional de Transplantes, fica estabelecido por meio da Portaria 2.040 (2008):

São contraindicações absolutas para o transplante cardíaco: HIV positivo; Câncer nos últimos 3 anos (exceto no colo uterino e de pele); Hipertensão pulmonar fixa (resistência vascular pulmonar maior 6-7 unidades; Wood não caindo abaixo de 4 U com vasodilatador); Incompatibilidade na prova cruzada entre doador e receptor; Falta de aderência ao tratamento; Diabetes insulino – dependente com lesões significativas de órgãos alvo; Doença com expectativa de vida menor que o transplante; Doença cérebro vascular ou periférica grave; Doença hepática ou renal irreversível (considerar transplante associado); Perfil psicológico/psiquiátrico desfavorável, alcoolismo e/ou toxicomania ativos; Doença pulmonar severa; Contraindicação à imunossupressão.   

    Já a inscrição na fila de espera, é feita a partir de equipes de referência credenciadas pelo Ministério da Saúde, via Sistema Nacional de Transplantes. Quanto à prioridade, esclarece-se que, ao admitir que um paciente em estado extremamente grave tenha prioridade em ser receptor, não se fere o princípio da igualdade, mas sim, é preservado o direito à vida. A necessidade do transplante de fígado, por exemplo, pode levar ao câncer, mas se o paciente for transplantado em tempo hábil, a cura é provável. Por outro lado, ficar na lista de espera nessas condições significa uma condenação à morte (PET, 2010).

    De acordo com o novo regulamento do Sistema Nacional de Transplantes, fica estabelecido ainda que pessoas com até 18 anos têm prioridade para receber órgãos de doadores na mesma faixa etária. Além disso, todas as crianças e adolescentes podem se inscrever na lista para transplante de rim, mesmo antes de entrarem em algum tipo de diálise. Segundo o Ministério da Saúde (1997), isso se deve à maior expectativa de vida desses pacientes. Os doadores que tenham alguma doença transmissível também poderão doar para pacientes que tenham o mesmo vírus. Dessa forma, órgãos de um doador que tenha hepatite C, por exemplo, agora já podem ser transplantados em pessoas que também sejam portadoras da mesma doença.

    Não é possível delimitar um tempo mínimo ou máximo para o recebimento, pois tudo depende do órgão ou tecido doado e do Estado onde o receptor está. Para facilitar a organização desse processo e agilidade de recepção da doação, já na lista de espera, os receptores são separados por órgãos, tipos sanguíneos e outras especificações técnicas. Esta lista única apresenta uma ordem cronológica de inscrição, sendo os receptores selecionados nessa ordem, em função da gravidade ou compatibilidade sanguínea e genética com o doador, assegurando a seriedade e a transparência do processo. Portanto, a distribuição de órgãos não é somente pelo tempo de inscrição na fila, dependendo também de outros critérios específicos.

    De acordo com a Portaria 2600 do Ministério da Saúde (2009), para cada órgão ou tecido que se encontra disponível, deve ser realizada a conexão entre os predicados antropométricos, imunológicos, clínicos e sorológicos do doador falecido e o Cadastro Técnico Único (CTU) adequado, aplicando-se os critérios específicos a cada tipo de órgão, tecido, células ou partes do corpo humano. Desta forma, é possível fazer a classificação dos potenciais receptores quanto à sua precedência. Para os receptores que estão na fila de espera é possível acompanhar sua posição na lista através do Portal do Ministério da Saúde.

    Um processo complexo, cheio de regras, que invoca a constante tomada de decisão por parte dos profissionais que compõem a equipe de transplante. Decisões geralmente realizadas de forma imediata, respaldadas em critérios técnicos, mas também permeadas de subjetividade e, que refletem diretamente sobre aspectos psíquicos desses profissionais. Lembra-se, pois, que a maioria dos pacientes que estão na fila do transplante é composta por pessoas que “correm contra a morte” e que têm o transplante como uma única alternativa de vida. Os profissionais sabem, portanto, que ao decidir pela inclusão ou exclusão do paciente na lista de espera, o seu posicionamento tem significado de vida ou de morte (CARVALHO, 2004). Decisão essa que precisa ser notifica pelo próprio profissional (que tem o dever de fazê-lo) ao paciente (que tem o direito de sabê-lo), seja a notícia positiva ou não. Lembra-se, pois, que, segundo o Código de Ética Médica (2009), Capítulo V – relação com pacientes e familiares, Art. 34, fica vedado ao médico: deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação ao seu representante legal. Portanto, se faz compreender que apenas o médico tem como dever prescrever ou informar o diagnóstico para um paciente, pois diferente dos outros profissionais da saúde ele possui uma formação acadêmica, a qual o prepara teoricamente para portar más noticias ao paciente.

    Contempla-se, portanto, que frente ao cuidado desses pacientes, e com a responsabilidade sobre essa decisão, os profissionais de saúde podem desenvolver uma série de sentimentos e emoções causados pelo acompanhamento do processo de doença evolutiva e pelo confronto com a proximidade da morte do paciente (CARVALHO, 2004). Existem ainda os sentimentos negativos de fracasso, frustração e impotência. Reconhece-se, pois, que, desde sua formação acadêmica, esses profissionais lidam com a visão da morte interdita, que deve ser vista como uma inimiga a ser vencida. Cria-se, assim, um sentimento de onipotência, que conduz aos profissionais à função de salvar o paciente, impedindo a morte deste a qualquer custo (AMARAL et al., 2008). Morte, que muitas vezes não pode e não deve ser evitada, principalmente na área de transplantes cardíacos.

    Uma questão multidisciplinar que perpassa pela Gestão de Saúde, Saúde Coletiva, Cardiologia, Tanatologia e Psicologia da Saúde. Mais especificamente sobre a Psicologia da Saúde, compreende-se que ela tem o objetivo de compreender como os fatores biológicos, comportamentais e sociais influenciam na saúde e na doença (APA, 2003). Constitui-se como disciplina que visa melhor entender as questões relativas à saúde, trazendo a aplicação dos conhecimentos e das técnicas psicológicas à saúde, às doenças e aos cuidados de saúde, agindo também na proposição de políticas de saúde.

    Diante do exposto, o presente trabalho tem como objetivo compreender os aspectos cognitivos e emocionais que permeiam o processo de tomada de decisão da equipe de saúde sobre a escolha do candidato do transplante de coração e as repercussões desse processo para os profissionais.

MÉTODO

Tipo de estudo

         O presente estudo trata-se de uma pesquisa descritiva e exploratória, de cunho qualitativo, abordando um aspecto pouco explorado na literatura. 

Participantes 

         Contou-se com a participação de duas enfermeiras (Participantes 1 e 2) e dois médicos (Participantes 3 e 4) responsáveis pela tomada de decisão sobre a escolha do paciente a ser transplantado no principal hospital de referência em doenças e tratamentos de cardiopatias em Fortaleza (Ceará).  

Instrumento 

        Foi utilizado um roteiro de entrevista semiestruturada, contendo questões sobre: patologias; os critérios de inclusão e exclusão que permeiam a tomada de decisão para o transplante; como essa decisão repercute de forma cognitiva e emocional  no médico; quais os critérios para fazer parte dessa junta de tomada de decisão; e como se dá o poder do médico diante dessa decisão.

     Procedimentos de Coleta de Dados 

       A pesquisadora, que já estagia na instituição, entrou em contato com os médicos e enfermeiras explicando os objetivos da pesquisa e solicitado sua autorização por escrito, via Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Posteriormente as entrevistas foram realizas, de forma individual, com auxílio de gravador. 

Análise dos Dados 

         As entrevistas foram avaliadas através de Análise de Conteúdo de Bardin (1977), seguindo a estrutura de etapas recomendadas: 1) organização da análise; 2) codificação da mensagem; 3) categorização e contabilização das frequências das Unidades de Contexto Elementar (UCEs); e 4) inferência.

Aspectos Éticos

        Considerando-se os aspectos éticos referentes a pesquisas envolvendo seres humanos, o presente estudo foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa da Unifor por meio do parecer N. 1.104.598 de 05/06/2015. Reforça-se ainda que os participantes foram informados previamente a respeito dos objetivos e procedimentos da pesquisa, assim como do seu anonimato e da confidencialidade de suas respostas. Foi também solicitado aos participantes que lessem e assinem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, cujo modelo foi elaborado de acordo com a Resolução no 466/12 sobre pesquisa envolvendo seres humanos (2012). Este documento explicita a solicitação dos sujeitos para participação no estudo, por via escrita, informando ainda que este consentimento garante ao participante o direito de interromper sua colaboração na pesquisa a qualquer momento, caso julgasse necessário, sem que isso implicasse em constrangimento ou prejuízo de qualquer ordem.

RESULTADOS E DICUSSÃO

    O corpus geral foi constituído por quatro entrevistas, Unidades de Contexto Inicial (UCI), que contabilizaram 247 Unidades de Contexto Elementar (UCE), distribuídas em quatro categorias: 1) Os critérios de inclusão para o transplante (72 UCEs); 2) O parecer sobre o transplante (77 UCEs); 3) O portador da notícia (21 UCEs); 4) As reações dos pacientes excluídos do transplante (30 UCEs); e 5) Aspectos emocionais dos profissionais responsáveis pela decisão do transplante (47 UCEs). A seguir, são apresentadas as referidas categorias.

    A primeira categoria, “Os critérios de inclusão para o transplante”, composta por 72 UCEs, apresenta a percepção dos entrevistados sobre como se dá a seleção dos critérios de inclusão estabelecidos por lei na observação prática dos pacientes.

Precisa se basear nos pacientes que podem e nos pacientes que não podem, em relação social, em relação a adesão […] É difícil a gente incluir uma pessoa que a gente sabe que ela não vai aderir ao pós, porque a gente sabe que a família não vai apoiar, porque a gente sabe que ela não tem uma estrutura física, que ela não tem uma estrutura de casa, um ambiente adequado para ter um pós. Então a gente como ser humano aceitar isso é muito complicado. A vontade que a gente tem é de pegar e levar pra um canto que a gente possa resolver isso, mas infelizmente a gente não pode fazer isso. E, por outro lado, a gente pensa que a gente vai dar um coração pra uma pessoa dessa que não vai dar continuidade, enquanto outro que tem toda a condição de receber. Então é uma luta diária entre o seu racional e o seu emocional (Participante 2).

É importante a decisão do médico, e que ele tenha conhecimento de uma maneira geral do paciente, não só da doença, mais do paciente como um todo (Participante 3).

Os critérios de inclusão em termos emocionais até são mais fáceis, porque é mais fácil você incluir um paciente na fila do transplante, que é um paciente terminal e ai você está dando uma esperança pra ele e para você mesmo. Os critérios de exclusão são extremamente ruins, são ruins. É complicado, porque ele já é um paciente que esta excluído do processo de avaliação para transplante, quer dizer, que não tem muito o que fazer, é fechar o prognostico. Então os critérios de exclusão são angustiantes nesse sentido (Participante 4).

    As colocações dos profissionais corroboram, portanto, com a colocação da portaria 2600 do Ministério da Saúde (1997) que mostra que devem ser analisados todos os aspectos antropométricos do paciente, tal como as condições físicas e clinicas.

    A segunda categoria, “O parecer sobre o transplante”, composta por 77 UCEs, apresenta como se dá o parecer dos profissionais, dado em equipe; e como esse parecer é permeado por aspectos cognitivos e emocionais, por questões técnicas e subjetivas.

                                      Não existe o médico decidiu isso. Não existe. É um consenso (Participante 1). 

Por mais que eu tente ser técnico no meu parecer, não deixa de ter um componente de envolvimento, da empatia com o paciente, aquela ânsia de salvar. Então, quando eu sou chamado pra dar parecer de potencial avaliação para transplante, tem os critérios e tudo, mas minha primeira ideia é procurar tratamentos alternativos que levem a cura (Participante 4).  

Evidencia-se, portanto, que há uma distinção entre a teoria proposta e a realidade prática de trabalho dos profissionais, pois, segundo o Programa Estadual de Transplantes (PET, 2010) “o médico faz uma indicação precisa de transplante de órgãos e/ou tecidos”, não referindo o desejo singular desse profissional de salvar vidas.

    A terceira categoria “O portador da notícia”, composta por 21 UCEs, expõe relatos sobre a notificação da decisão ao paciente e família, que é responsabilidade do médico. Abordando ainda

Deve ser o médico, o médico é que deve dizer depois de colher todos esses dados, ele é quem tem que dizer para o paciente que ele tem uma contraindicação, compete a ele, se ele tiver uma contraindicação psicológica, a psicóloga da o seu parecer por escrito no prontuário dele mais o médico é quem tem que dizer pra ele, de uma forma que não deixe o paciente sem a esperança (Participante 3).

    Observa-se, portanto, que na prática, existe o respeito ao direito do paciente em ser notificado sobre a decisão a respeito do seu transplante, corroborando ainda com o Código de Ética Médica (2009), no cap. V, art. 34, que afirma que é dever do médico informar tanto o diagnóstico, como o prognóstico desse paciente.

    A quarta categoria “As reações dos pacientes excluídos do transplante”, composta por 30 UCEs, relata como o profissional vivencia as reações dos pacientes e familiares após a comunicação da notícia.

Eles ficam com raiva como se eu fosse o grande culpado daquela situação clinica. Então ai essa raiva passa por ameaças, ameaças jurídicas. Assim: ‘Se ele morrer, você vai ver, vou chamar meu advogado. Bote por escrito e me entregue por escrito que você esta condenando meu pai à morte’. Então, assim, existem ameaças, ameaças jurídicas mesmo de me processar porque eu estou contraindicando o transplante (Participante 4).

    Reforça-se, todavia, que, apesar desses problemas decorrentes da não compreensão e revolta de familiares e pacientes, esses profissionais são respaldados por lei, por meio da Portaria 2.040 (2008), que apresenta todos os critérios pelos quais o paciente deve passar, caso o contrário será excluído.

    A quinta categoria “Aspectos emocionais dos profissionais responsáveis pela decisão do transplante”, composta por 47 UCEs, relata de que forma, tal experiência da tomada de decisão, repercute no emocional desse profissional.

Eu me sinto muito realizada quando eu vejo ele vindo pra transplante (Participante 1).

Afeta bastante, afeta bastante. Então assim, você sofre, você fica lamentando. A gente sabe que é porque o coração era ruim pra ele; […] Mas, assim, a expectativa que a gente criou naquela pessoa, aquele preparo, aquela ansiedade que a gente trabalha, que a gente conduz um potencial, esperando em vê-lo na mesa pra ir por transplante. Então a gente lamenta por isso (Participante 2).

A gente fica, a gente fica querendo sempre procurar uma solução. Eu mesmo já ultrapassei muitas contraindicações, pra poder tornar benéfico pra ele, pra poder abrir o caminho dele pra ele ir pro transplante. Isso ai eu já fiz muitas vezes. Em muitas eu acertei, porque deu certo depois. Mas em muitas eu errei (Participante 3).

Frustração, impotência, um pouco de revolta, revolta por impotência, por você não poder resolver, você quer resolver um problema, mas não tem como. Então você se sente inseguro por aquela circunstancia clinica. Então existem as contraindicações que não adianta teimar (Participante 4).

    Relatos que corroboram com Amaral et al. (2008), que relata que frente ao cuidado desses pacientes, o médico pode desenvolver uma série de sentimentos e emoções causados pelo confronto com a proximidade da morte do paciente. São, principalmente, sentimentos negativos de fracasso, frustração e impotência.

CONCLUSÃO

    A tomada de decisão para o transplante cardíaco se mostra difícil, não só para o paciente, mas também a equipe multidisciplinar e por fim ao médico, responsável por essa decisão.  Essa resolução é de uma complexidade e de muitas vezes um sofrimento psicológico para esse profissional, pois, apesar de envolver um arcabouço de regras constituídas por lei, não há como se sobrepor totalmente ao desejo singular desse profissional de salvar vidas.

    Diante dessa visão da falta de suporte psicológico recebido por esse profissional, se faz necessário um maior aprofundamento das possibilidades de apoio não só voltadas para o paciente mais também para essa equipe, no qual se sabe que devido a grande demanda interna dos pacientes na organização, esse suporte acaba sendo falho para os profissionais.

    Portanto se faz como sugestão a inserção de um apoio, uma assistência voltada apenas para esses profissionais, não só os da unidade de transplante mais dentre todas as unidades existentes no hospital, pois a sobrecarga psíquica recebida por esses profissionais ainda é grande.

REFERÊNCIAS

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PROGRAMA ESTADUAL DE TRANSPLANTES (PET). Disponível em: <http://www.transplante.rj.gov.br/Site/Conteudo/PerguntasRespostas.aspx>. Acesso em 06 nov. 2014.

Autores

Cynthia de Freitas Melo – Psicóloga. Doutora em Psicologia. Professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade de Fortaleza. Coordenadora do Laboratório de Estudos e Práticas em Psicologia e Saúde (LEPP-Saúde). Email: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. 

Pammela Lima Assunção – Psicóloga pela Universidade de Fortaleza. Email: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. 

Bárbara Jéssyca Magalhães – Graduanda em Psicologia pela Universidade de Fortaleza. Email: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. 

João Lins de Araújo Neto – Médico cardiologista do Hospital Doutor Carlos Alberto Sturdart Gomes. Email: joãEste endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

PUBLICADO EM MARÇO DE 2017.

REVISTA PSICOPEDAGOGIA ON LINE. ISSN: 1808-6225